Poema Estranho

É estranho não poder abraçar.

O que não quer dizer que vá abraçar.

Mas é uma escolha minha

Que agora me foi negada.

 

É estranho não sentir o respirar da pele de outra pessoa

Ao meu lado.

Não sentir o toque leve de mãos no pescoço

Que me arrepia, sempre.

 

É estranho não haver mais esses arrepios entre gentes que se encostam.

 

É estranho ser gente sem gente.

Fugir ao toque mas ansiar por ele.

Negar o abraço em nome da fraternidade

E o beijo em nome do amor.

 

É estranho.

 

Caminhar nas ruas de uma cidade despida

Sempre despida agora

Sempre sem vozes

A rua já nem é rua, só a moldura dela.

 

É estranho não ver rostos, só máscaras.

Não cruzar olhares, apenas evitar cruzar caminhos.

É estranho não dominar o tempo.

Ser irrelevante um calendário, uma agenda…

Agora vazia de viagens e sonhos.

É estranho ter bilhetes para um amanhã incerto

É estranho perder as rotinas carinhosamente criadas

Jantar sem companhia

Não conseguir brindar fora de um espelho.

 

É estranho viver história que nunca pensei viver

E reviver realidades de ontem e de amanhã

Mas que nunca pensei de hoje.

 

É estranho, é confuso, é desconcertante

Repensar-me sem ninguém

Recentrar-me através da solidão da proximidade…

É estranho vaguear por aqui e além

E não me encontrar em nenhum beco ou banco de jardim.

 

Quem somos? Quem seremos?

Outros artigos deste autor >

Ativista. Formada em Antropologia. Deputada na Assembleia Municipal de Viseu pelo Bloco de Esquerda.

O renascer da arte a brotar do Interior e a florescer sem limites ou fronteiras. Contos, histórias, narrativa e muita poesia.

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