É estranho não poder abraçar.
O que não quer dizer que vá abraçar.
Mas é uma escolha minha
Que agora me foi negada.
É estranho não sentir o respirar da pele de outra pessoa
Ao meu lado.
Não sentir o toque leve de mãos no pescoço
Que me arrepia, sempre.
É estranho não haver mais esses arrepios entre gentes que se encostam.
É estranho ser gente sem gente.
Fugir ao toque mas ansiar por ele.
Negar o abraço em nome da fraternidade
E o beijo em nome do amor.
É estranho.
Caminhar nas ruas de uma cidade despida
Sempre despida agora
Sempre sem vozes
A rua já nem é rua, só a moldura dela.
É estranho não ver rostos, só máscaras.
Não cruzar olhares, apenas evitar cruzar caminhos.
É estranho não dominar o tempo.
Ser irrelevante um calendário, uma agenda…
Agora vazia de viagens e sonhos.
É estranho ter bilhetes para um amanhã incerto
É estranho perder as rotinas carinhosamente criadas
Jantar sem companhia
Não conseguir brindar fora de um espelho.
É estranho viver história que nunca pensei viver
E reviver realidades de ontem e de amanhã
Mas que nunca pensei de hoje.
É estranho, é confuso, é desconcertante
Repensar-me sem ninguém
Recentrar-me através da solidão da proximidade…
É estranho vaguear por aqui e além
E não me encontrar em nenhum beco ou banco de jardim.
Quem somos? Quem seremos?