Na tarde do dia 13 de setembro passado, decorria em Valongo, aldeia do concelho de Valpaços, distrito de Vila Real, um incêndio que mobilizou cerca de 300 bombeiros, 103 veículos e alguns meios aéreos. Deste incêndio resultou a destruição de 3 casas, uma vasta área ardida, com consequências nas culturas agrícolas. Segundo populares, tudo em volta da aldeia ardeu, e afetou castanheiros, oliveiras, vinhas… Alguns habitantes durante a noite chegaram a ver as chamas a 100 metros das suas casas.
A aldeia de Valongo, à semelhança do que acontece com tantas outras aldeias do distrito e do interior do país, é essencialmente habitada por população idosa, onde encontramos muitas casas degradadas e abandonadas, mas também várias vivendas e construções recentes, cujos proprietários são emigrantes, e se encontram desabitadas durante a maior parte do ano. Em Valongo há realmente alguma produção agrícola, mas também há muitos terrenos abandonados.
Em consequência do envelhecimento da população também aí se tem vindo a verificar um contínuo abandono das propriedades e uma ausência de intervenção silvícola e gestão dos povoamentos.
Quando arde a floresta, o meu pensamento primordial é: quem a estava a cuidar para que não ardesse? Afinal quem cuida e como cuida da floresta?
Para responder a isso começo por procurar os Planos Municipais de Defesa da Floresta Contra Incêndios (PMDFCI). Pelo menos, nos três municípios onde procuro, Chaves, Valpaços e Montalegre há informação online de PMDFCI atualizados. No caso de Valpaços, o plano de 2016-2020 é indicado na página oficial do Município como aprovado, é possível consultar o caderno I – diagnóstico, mas o caderno II – Plano de Ação, não estava disponível online. Consultando estes documentos conseguimos perceber dados importantes, entre outros, as causas, a distribuição das ocorrências e da detenção dos incêndios.
Por exemplo, no PMDFCI do Município de Chaves (2015-2019), refere-se que a maior incidência de incêndios florestais é ao fim-de-semana. Considerando-se inclusivé que em 2014 o sábado é denominado o dia negro em termos de área ardida. No que se refere às fontes de alerta das ocorrências, nos PMDFCI de ambos municípios é referido que a maior parte dos alertas são dados pelos populares. Por exemplo, em Chaves entre 2002-2014, constituiu 40% das ocorrências. Denota isto, talvez, alguma desatenção por parte do pessoal afeto à vigilância? Será que a extinção em 2006 do Corpo Nacional da Guarda Florestal (CNGF) contribuiu para melhorar o alerta e a vigilância?
Segundo o quinto Relatório Provisório de Incêndios Rurais de 2019, desde o início do ano até 31 de agosto, já vamos com 28552 ha de área ardida em Portugal continental e com 8082 fogos rurais. No mesmo documento podemos observar, por exemplo, que da totalidade de incêndios rurais, 74% foram investigados e a investigação permitiu apurar as causas de 3963 incêndios (66% dos investigados). Assim, chegou-se à conclusão que 25% das causas de fogos são atribuídas a incendiarismo – imputáveis e 40% ao somatório de vários tipos de queimadas. Voltando aos PMDFCI dos Municípios de Chaves e Valpaços verificamos que ambos referem, precisamente, que a maior parte das causas dos incêndios florestais rurais são as queimadas e incendiarismo.
Mas, voltando à questão da vigilância e prevenção, uma notícia do Público de 3 de agosto de 2018, referia-se a uma diversificada e complementar operação, precisamente de vigilância e prevenção, envolvendo agentes da GNR, SEPNA, GIPS. Salvaguardando contudo a competência dos agentes, pergunto-me: Até que ponto estas forças estão coordenadas, articuladas e especializadas na vigilância da Floresta?
Ao falar de incêndios, acabamos sempre a falar noutras questões, entre as quais: o despovoamento e o abandono das propriedades agrícolas, a falta de vigilância e falta de cuidado e gestão da floresta, bem como as tão mencionadas alterações climáticas.
Precisamos efetivamente de políticas florestais assentes na boa gestão do território. A gestão, faz-se essencialmente a nível local, mas para isso os municípios ou as regiões, precisam de verbas que sejam especificamente direcionadas para a prevenção e para a gestão dos espaços florestais, de acordo com as especificidades locais de forma sustentável concebendo as alterações a longo prazo, não só ao nível de clima mas também da adaptabilidade de espécies e ecossistemas na consequências das alterações climáticas.
Há, ainda, quem opine que o ICNF (Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas) poderia dar melhor exemplo na gestão dos espaços florestais e que faz falta apoiar os privados, nomeadamente a população mais envelhecida, na gestão dos espaços florestais.
Se nos debruçarmos ainda sobre o quinto Relatório Provisório de Incêndios Rurais de 2019, e focando-nos em dados do nosso distrito, Vila Real, deparamos que quanto a área ardida, Montalegre localiza-se em sétimo lugar como o concelho com maior área ardida. Por sua vez, Vila Real é o nono concelho do país com maior número de incêndios rurais.
Já diz o adágio popular: Com o fogo não se brinca! Mas, é impossível ficar indiferente ao fato de que os fogos não são levados a sério pelo governo do nosso país, quando, pelos vistos as golas antifumo – que afinal não eram golas a sério – são o elemento principal de um enredo, onde os indícios de crime de participação económica em negócio e o desvio de fundos que poderiam servir à proteção e prevenção, são coisas sérias.
Nasceu em Chaves no ano de 1979.
Licenciada em Ensino Biologia-Geologia pela Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, no ano de 2001. Mestre em Ciências de Educação - Especialização em Animação Sociocultural pela UTAD. Frequentou o 2.°ciclo do curso Bietápico de Licenciatura em Engenharia do Ambiente e do Território do Instituto Politécnico de Bragança.
Lecionou, como docente contratada do grupo de Biologia e Geologia, em várias escolas do país.