Anúncios do Governo sobre habitação “não mudam absolutamente nada”

No encerramento do encontro “Semear Coesão”, Catarina Martins denunciou a “visão extrativista” do poder face aos territórios do interior, bem ilustrada esta semana na recusa do PS em aplicar IMI às barragens ou na “economia rentista” que o Governo promove à boleia dos fundos europeus. Artigo esquerda.net
“Semear Coesão – Encontro do Interior do Avesso 2023”. Foto de Tiago Resende

O encontro “Semear Coesão” juntou este sábado no Fundão mais de 20 convidados para discutirem em várias sessões de debate estratégias para o interior, desde a valorização da floresta e património natural, passando pela mobilidade e pelas situações de isolamento das populações, ou as especificidades dos desafios enfrentados por quem vive, trabalha, estuda ou é ativista no Interior.

No encerramento dos debates, Catarina Martins destacou o “património de pensamento sobre o território, o desenvolvimento e o interior” que o Bloco de Esquerda tem desenvolvido nos últimos anos e que considera não ter paralelo em qualquer outro partido português. Além destes encontros que se realizam desde 2015, foram muitas as iniciativas temáticas para ouvir e discutir com quem vive e trabalha nas várias localidades assuntos como a política cultural, o plano ferroviário nacional, a agricultura intensiva, a crise climática, entre outros temas.

A coordenadora bloquista acrescentou ainda que estas iniciativas ajudaram a fazer nascer “os movimentos anticonservadores que se constituíram como os primeiros movimentos relevantes de rua em 2022, o ano com as maiores marchas feministas e LGBTQI+ em todo o país, também no interior, com gente a marchar em sítios onde nunca se tinha saído à rua”.

Lembrando que “até nos concelhos onde o salário médio é dos mais baixos do país, o preço das casas aumentou mais de 50%”, Catarina referiu o pacote de medidas anunciado esta semana pelo Governo para o setor da habitação. “A direita e os grandes proprietários vieram logo dizer que vem aí o fim do mundo” mas, contrapôs Catarina, não têm razões para se preocuparem porque “os anúncios do Governo não mudam absolutamente nada”: os projetos sobre obras coercivas e rendas seguras “já existem e produziram zero resultados até agora”; e no alojamento local, “há-de mudar lá para 2030, agora não muda nada porque as licenças já estão suspensas nas zonas de grande intensidade”. O que sobra é a vontade do Governo em “financiar bancos e senhorios que pedem tanto a quem trabalha que as pessoas já não conseguem pagar”. Ou seja, “não fazem nada para baixar os preços, financiam a especulação imobiliária para manter extamente os mesmos preços que tinham”.

“A especulação financeira e imobiliária é dos maiores negócios do nosso país. E o Governo não quer que se toque nada. Mesmo a ideia de aumentar o parque público de habitação, o ministro da Economia já a veio desmentir”, prosseguiu Catarina, prevendo que “o movimento de protesto nas ruas não vai parar porque as pessoas precisam agora de uma casa que possa pagar” e não daqui a dez anos. “Com maioria absoluta ou sem maioria absoluta, é a força social que muda o país”, garantiu.

“Há sempre uma economia rentista por detrás de cada anúncio”

Na conclusão destes debates sobre os territórios do interior, a coordenadora bloquista apontou o dedo à “economia rentista e de privilégio” que vive “sempre à conta da incapacidade do país ter um projeto de desenvolvimento económico ambientalmente sustentável e de coesão territorial e social”. E deu o exemplo do debate após os incêndios mortíferos de 2017 e as mudanças legislativas que se seguiram, questionando: “Algum agricultor ou proprietário florestal tem neste momento meios para o serviço ecológico que precisamos que faça ao país? Nada!”.

O que foi feito desde então foi a criação de “entidades de gestão sem ligação real ao território” e que não passam de “uma forma de sacar fundos”, pois “há sempre uma economista rentista por detrás de cada anúncio e esse é o desastre do nosso país”, lamentou Catarina, apoiando-se no exemplo próximo da aldeia do Barco, onde foi feito um investimento com dinheiros europeus para uma área de regadio. “Acabam esses fundos, agora já não interessa nada o regadio, o que interessa é o lítio. Não interessa se há lítio ou se não há. O que interessa é que haja fundos europeus, provavelmente para pagar aos mesmos que já ganharam com o regadio, para agora dizerem que vão fazer outra coisa qualquer. No fim, fica zero no território”. Outro exemplo desta “visão extrativista do interior” é a agricultura intensiva que não se limita apenas ao Alentejo. Está a espalhar-se pelo território e “a deixar o rasto de desastre dos solos deteriorados, da água inquinada e sobretudo este desastre humano que é uma economia que vive da miséria e da exploração” dos trabalhadores imigrantes.

Outro exemplo desta “economia extrativista do interior” ficou patente esta semana com o PS a chumbar no Parlamento que as barragens paguem o respetivo IMI. “A produção de energia é dos negócios milionários do país, quase toda a energia é produzida no interior do país e fica cá zero”, pois estes são negócios “que não criam postos de trabalho e que não pagam sequer impostos nas terras onde estão”, concluiu Catarina.

Notícia publicada em esquerda.net

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