São cerca de 7 mil milhões de euros dos dois orçamentos do estado de 2020 que “podiam ter sido utilizados no apoio social, apoio à economia e no reforço à Saúde”. Por isso, Catarina apresentou nove propostas para implementar já no estado de emergência.
Em conferência de imprensa este sábado, Catarina Martins apresentou nove propostas do Bloco de Esquerda para corrigir as insuficiências do decreto-lei do estado de emergência que irá vigorar até ao final de março no que toca às licenças para os pais e condições de teletrabalho, apoios aos cuidadores e aos desempregados, bem como apoio às crianças, reforço do complemento salarial dos profissionais de saúde e apoio ao setor da restauração.
E relembra que ficaram por gastar 7 mil milhões de euros de dois orçamentos do Estado em 2020, aprovados pelo Bloco de Esquerda, que “podiam ter sido utilizados no apoio social, no apoio à economia e no reforço à Saúde. E não o fez” apesar de “ter todos os instrumentos para o fazer”.
Segundo o INE, mais 200 mil pessoas que ficaram desempregadas neste período de confinamento. A este número acrescem as pessoas que já não estão registadas devido ao longo período de inatividade ou pessoas que, tendo perdido o emprego, não aparecem como desempregadas, como é o caso de empregadas domésticas com filhos, que ficaram simultaneamente sem emprego e sem possibilidade de procurarem emprego.
Dos trabalhadores despedidos, a grande maioria são trabalhadores precários que se acrescem a outros 200 mil precários que perderam o emprego em 2020. Além disso, os trabalhadores que perdem o emprego são sobretudo das profissões menos remuneradas e os mais jovens. Com o alargamento do período experimental para o dobro, os trabalhadores mais jovens acabaram por ser despedidos “sem sequer terem acesso ao subsídio de desemprego ou qualquer tipo de indemnização”.
Por outro lado, se os salários desceram em todo o mundo, em Portugal “desceram o dobro da média da União Europeia”, relembra Catarina. Na União Europeia a quebra foi inferior a 7%. Em Portugal, a queda foi de mais de 13%. Agravada para as mulheres (16%) face aos homens (11%).
“Portugal foi o país da União Europeia onde não só os salários tiveram a maior quebra, como aquele onde a desigualdade salarial entre homens e mulheres mais se fez sentir”, afirma.
Na execução dos orçamentos do ano anterior, o governo deixou por executar 7 mil milhões de euros. Ou seja, “o governo não executou na totalidade sequer o orçamento aprovado antes da pandemia ter chegado a Portugal”, relembra.
Com o orçamento suplementar, aprovado também pelo Bloco de Esquerda, foram aprovadas duas possibilidades: “gastar mais nos setores onde era necessário, nomeadamente Saúde e Segurança Social”; e “que o Ministro das Finanças tivesse a possibilidade de transferir verbas não utilizadas de áreas paralisadas, para iniciativas necessárias”.
Ficaram assim por gastar 7 mil milhões de euros de dois orçamentos do Estado que “podiam ter sido utilizados no apoio social, no apoio à economia e no reforço à Saúde. E não o fez” apesar de “ter todos os instrumentos para o fazer, com o voto a favor do Bloco de Esquerda”.
“O Governo fez desaparecer um Ministério da Educação inteiro do seu Orçamento”, e “quando pensamos na falta de computadores, técnicos, perguntamos que custo não está a ter neste momento o governo ter feito desaparecer o equivalente a um Ministério da Educação inteiro dos orçamentos”.
Portugal foi assim “o país da União Europeia que menos gastou na resposta à crise”. E isso revela que “foi uma opção, e não uma inevitabilidade”, diz. “Somos um dos países com maior impacto da crcise pandémica, seja do ponto de vista sanitário ou do ponto de vista económico e social, e somos o país da zona Euro que menos gastou no combate à pandemia”.
“Não há nenhum país do mundo que possa evitar os efeitos negativos desta pandemia. Mas sabemos que quanto menos gastamos na resposta à pandemia, seja nos meios de a controlar, seja na resposta social ou sanitária, maior será a crise. E a forma como o nosso país não tem investido é um verdadeiro problema para o futuro”, diz. Por isso, o partido quer que avancem “já” 9 medidas de emergência.
Em primeiro lugar, “os salários de quem fica em casa devem ser pagos a 100%”. A razão, diz, “é que, além dos salários terem descido, quem é obrigado a ficar em casa fica com apenas dois terços do salário. Não pretendemos mexer no tecto máximo ou mínimo, o salário de quem tem de ficar em casa a tomar conta das crianças seja pago por inteiro”.
O salário deve ser pago por inteiro, dentro do teto previsto (€1905). Quem fica em casa com filhos pequenos não pode ter um corte de um terço do salário.
Propõe também que “quem está em teletrabalho possa optar por uma licença e ficar a tomar conta dos filhos”. Neste momento, se um trabalhador está em teletrabalho, não tem direito a licença, seja uma família monoparental ou um casal. O problema é que “não é possível estar o dia todo em teletrabalho com uma criança em casa”, uma exigência que tem “provocado problemas graves” e que motivou já a Procuradora Geral da República a pedir ao Governo para alargar o acesso à licença.
A existência de um dos pais em teletrabalho não pode impedir o acesso ao apoio extraordinário à família. Quem cuida de crianças pequenas, tem de poder optar pelo apoio extraordinário e não ser obrigado a acumular com teletrabalho.
Em situação análoga está quem tinha familiares em Centros de Dia que agora encerraram e que, por isso, ficou obrigado a ficar em casa sem qualquer acesso a apoios. “Estes cuidadores informais precisam de apoio”, diz Catarina.
Quem tem de cuidar de pessoas dependentes, que estão neste momento em casa durante o dia por causa do encerramento temporário de equipamentos sociais (centros de dia, centros de atividades ocupacionais, centros comunitários), deve poder beneficiar do apoio extraordinário à familia.
Depois, é necessário alargar os prazos do subsídio de desemprego. “Como é que podemos pedir a alguém que perdeu o emprego em março e que já terminou o subsídio de desemprego que é agora, em profunda crise económica, que vão encontrar novo emprego?”
O apoio extraordinário para desempregados de longa duração só é acessível seis meses depois da prestação de subsídio de desemprego terminar, teoricamente pela perspetiva de encontrar trabalho neste período. “Esta regra não faz sentido nas atuais condições”, argumenta a coordenadora do Bloco de Esquerda. “A generalidade das pessoas não vão encontrar emprego. O país não pode desistir de políticas ativas de criação de emprego, mas não podemos dizer que um desempregado de longa duração vai encontrar emprego nesta situação”.
Propõe, também, a redução para metade do prazo de garantia para aceder ao subsídio de desemprego (6 meses) e ao Subsídio Social de Desemprego (3 meses). Esta medida “foi utilizada no início da primeira vaga pandémica” mas sem seguimento. O problema é que, para as pessoas que conseguiram encontrar emprego nos primeiros meses de desconfinamento do verão de 2020, não conseguiram os meses de descontos suficientes para acederem a qualquer uma destas prestações. Sendo a situação semelhante, esta medida deve ser recuperada.
Isto tem particular impacto nas trabalhadoras das cantinas das escolas que trabalharam desde o início do ano letivo até ao encerramento. Sendo contratadas em outsourcing, foram despedidas sem prazo de garantia necessário para os subsídios. Sendo “óbvio que é necessário alterar o vínculo laboral destas trabalhadoras, já esta quinta-feira poderíamos pelo menos fazer justiça a estas trabalhadoras para terem direito aos subsídios de desemprego e subsídio social de desemprego”.
– Durante todo o ano de 2021 – e não só seis meses – todas as prestações de desemprego devem ser prorrogadas.
– Quem recebe o apoio extraordinário para desempregados de longa duração não pode ficar seis meses sem receber qualquer apoio.
– Reduzir para metade o prazo de garantia para aceder ao subsídio de desemprego (6 meses) e ao Subsídio Social de Desemprego (3 meses).
Em Portugal existe uma rede social forte dentro das famílias. “Mas essa solidariedade não deve significar menos apoio público”, explica Catarina Martins. “Uma pessoa que já tinha uma vida autónoma mas, com a crcise pandémica, é obrigada a voltar para casa dos pais, basta estes ganharem o salário mínimo nacional para a pessoa ficar excluída de qualquer apoio”. E isto “não faz qualquer sentido”, porque “significa não apenas que o trabalhador empobrece como também a família empobrece”. Por isso, o Bloco propõe corrigir a condição de recursos.
A condição de recursos do Apoio Extraordinário ao Rendimentos dos Trabalhadores vai excluir milhares de pessoas pelo modo como se contabiliza o agregado. Deve ser corrigida imediatamente, para contabilizar de forma autónoma quem teve de ir morar para casa dos pais por causa da crise (estão a ficar de fora agora); contar cada membro do agregado como uma pessoa.
“Precisamos corrigir as prestações sociais para trabalhadores independentes ou empresas unipessoais. Há atividades que foram encerradas por decreto do Governo, e há atividades que, não tendo sido encerradas, não têm acesso a apoios”, explica. O setor do turismo, por exemplo, não foi proibido, mas não há mercado. E isso tem impacto em toda uma cadeia de serviços que também não têm apoio, seja lavandarias ou atividades culturais. “esta divisão entre atividades encerradas por decreto ou sem decreto cria uma injustiça enorme mascarada por uma ficção de atividade que não existe”.
– Nos apoios aos trabalhadores independentes entretanto retomados (seja para apoio à família, seja por redução de atividade) o rendimento médio de referência deve ser de 2019 e não o de 2020.
– Os apoios extraordinários retomados pelo Governo (“Apoio à Redução de Atividade”) não devem aplicar-se apenas às atividades administrativamente encerradas, mas a todos os trabalhadores. Alguns exercem atividade em setores diferentes, uma encerradas por lei outras não.
O Bloco de Esquerda pretende também que, no decreto-lei do estado de emergência, seja adotada uma majoração salarial para compensar as horas extraordinárias que aumentaram exponencialmente desde o início da crise, horas que “nunca serão pagas nem compensadas”. O governo melhorou a compensação “mas excluiu vários profissionais” da compensação, seja de quem lida diretamente com os doentes ou de quem garante a higienização dos espaços. “Todos os profissionais de saúde são necessárias. Seja pessoal médico, terapeutas, técnicos, auxiliares. Todos eles estão a fazer uma brutal carga de horas extraordinárias. E esta remuneração “um pouco mais alta tem de se aplicar a todas as profissões do SNS. Estão a trabalhar como equipa, e é como equipa que devem ser respeitados”, diz.
O governo prevê a majoração do trabalho suplementar e possibilidade de aumento de horário (remunerado) dos profissionais do SNS. Mas o decreto exclui vários profissionais de saúde, como assistentes operacionais, técnicos de diagnóstico e terapêutica ou técnicos superiores de saúde. Nenhum profissional de saúde pode ser deixado para trás.
Para as crianças, numa crise “há famílias que perdem rendimento muito depressa”, em prazos “incompatíveis com os critérios burocráticos” de avaliação do escalão de apoio social. Por isso, o Bloco propõe que “todas as crianças que precisam, seja por sinalização da escola, seja porque as famílias dão nota disso mesmo à escola, devem ter acesso a refeições escolares de forma distribuída por todo o território”.
As refeições nas escolas devem ser alargadas e deve ser criado serviço de take-away nas cantinas. Os critérios devem ser alargados para incluir crianças vulneráveis e não apenas aquelas que integram a Ação Social Escolar, sendo esta calculada com rendimentos que não consideram os efeitos da crise.
O Estado deve comparticipar um programa para que restaurantes, em todo o país, possam confecionar refeições para apoiar famílias que caíram na pobreza. Programa deve ser finado pelo governo e operacionalizado pelas autarquias. Resolve dois problemas: permite que muitos restaurantes resistam às restrições e muitas famílias resistam à crise.