Catarina Efigénia Sabino Eufémia nasceu em Baleizão, no Alentejo, foi morta a tiro a 19 de maio de 1954 numa carga policial que dispersava um protesto operário de 14 mulheres. Era ceifeira, era mulher rural, tornou-se símbolo da luta popular contra o regime salazarista, símbolo da luta antifascista, e como tal foi imortalizada através da arte em poemas, cantigas, gravuras…
Há precisamente 66 anos, em plena época da ceifa do trigo, Catarina e treze companheiras de ofício foram reivindicar junto do feitor da propriedade um aumento de 2 escudos por jornada. Atemorizado pelas 14 mulheres, o feitor deslocou-se a Beja buscando auxílio do proprietário e da Guarda Nacional Republicana (GNR). Com um filho de oito meses nos braços, Catarina foi atingida, segundo a autópsia, por “três balas, à queima-roupa, pelas costas, actuando da esquerda para a direita, de baixo para cima e ligeiramente de trás para a frente, com o cano da arma encostada ao corpo”.
CATARINA EUFÉMIA | Sophia de Mello Breyner Andresen
O primeiro tema da reflexão grega é a justiça
E eu penso nesse instante em que ficaste exposta
Estavas grávida porém não recuaste
Porque a tua lição é esta: fazer frente
Pois não deste homem por ti
E não ficaste em casa a cozinhar intrigas
Segundo o antiquíssimo método oblíquo das mulheres
Nem usaste de manobra ou de calúnia
E não serviste apenas para chorar os mortos.
CANTAR ALENTEJANO | Vicente Campinas
Chamava-se Catarina
O Alentejo a viu nascer
Serranas viram-na em vida
Baleizão a viu morrer
Ceifeiras na manhã fria
Flores na campa lhe vão pôr
Ficou vermelha a campina
Do sangue que então brotou
Acalma o furor campina
Que o teu pranto não findou
Quem viu morrer Catarina
Não perdoa a quem matou
Aquela pomba tão branca
Todos a querem p’ra si
Ó Alentejo queimado
Ninguém se lembra de ti
Aquela andorinha negra
Bate as asas p’ra voar
Ó Alentejo esquecido
Inda um dia hás-de cantar
Poema musicado por Zeca Afonso.
RETRATO DE CATARINA EUFÉMIA | José Carlos Ary dos Santos
Da medonha saudade da medusa
que medeia entre nós e o passado
dessa palavra polvo da recusa
de um povo desgraçado.
Da palavra saudade a mais bonita
a mais prenha de pranto a mais novelo
da língua portuguesa fiz a fita encarnada
que ponho no cabelo.
Trança de trigo roxo
Catarina morrendo alpendurada
do alto de uma foice.
Soror Saudade Viva assassinada
pelas balas do sol
na culatra da noite.
Meu amor. Minha espiga. Meu herói
Meu homem. Meu rapaz. Minha mulher
de corpo inteiro como ninguém foi
de pedra e alma como ninguém quer.
LINOGRAVURA MORTE DE CATARINA EUFÉMIA | José Dias Coelho no Museu do Neo-Realismo
Escrito por CG