O que te levou a encabeçar esta candidatura?
A escolha foi coletiva, e eu aceitei encabeçar a lista do Bloco de Esquerda ao círculo eleitoral de Viseu porque sinto que tenho alguma responsabilidade em intervir no estado de coisas no país. Há um projeto, há um programa, e vamos à disputa dele, porque Portugal precisa disso. Aceitar encabeçar a candidatura fica mais fácil quando já se vem fazendo um trabalho na Distrital de Viseu, em particular em Mortágua, mas não só, e se sente conforto e confiança nas pessoas que me rodeiam.
Com base na tua experiência enquanto profissional e/ou ativista, o que nos podes dizer sobre habitação no interior?
Portugal tem uma taxa baixíssima de habitação pública – 2%. O Interior, salvo raras exceções, mantém-se perto desses valores. É preciso construir habitação pública também no interior. As prestações aos bancos têm juros elevadíssimos e as rendas já estão bastante elevadas, com o risco de continuarem a subir no Interior, dada a inação governamental. É preciso também resolver problemas relacionados com a pobreza energética. Morre-se de frio em Portugal, e também no Interior, e isso não é aceitável. Ao mesmo tempo, é preciso preparar a habitação para ondas de calor que prometem ser mais intensas e mais frequentes.
Qual a(s) maior(es) preocupação(ões) no teu distrito?
Há preocupações que me parecem transversais às classes sociais a que pretendemos responder – o salário ou a pensão é a maior delas todas. É o drama de Portugal – temos um economia de baixos salários, mas temos condições para os subir. E a inação governamental perante a crise da inflação, provocada por aumentos das margens de lucro, sob a desculpa de “espirais inflacionistas”, piorou ainda mais a situação. Vivemos numa sociedade tremendamente desigual e lutar contra essa desigualdade é fundamental. Esta desigualdade económica depois ramifica-se – as mulheres recebem ainda menos que os homens; e tem graves consequências na luta contra a crise climática.
Uma outra preocupação central no distrito de Viseu é o esvaziamento e abandono do Interior, que tem as mais variadas consequências. Na mobilidade, com falta de transportes e de investimento na ferrovia, seja nas linhas que já existem ou nas que faltam construir. Na saúde, quando nos fecham valências de hospital, urgências, extensões de saúde ou nos retiram os serviços de emergência. É em tudo o que é serviços públicos, desde correios a tribunais.
Que filme e que livro gostarias de partilhar?
Um filme que gostaria de partilhar, até porque é um filme que revejo algumas vezes, é o Hunt For The Wilderpeople, realizado por Taika Waititi. A personagem principal é o Ricky, um pré-adolescente neozelandês, que é adotado por uma família do campo quando até aí vivia numa cidade. A história trata do estabelecimento de relações interpessoais, da criação de um sentimento de pertença e de sobrevivência. Tem um sentido de humor e cenas mais tensas, e, não sendo um filme demasiado profundo, conforta-me.
Um livro com o qual aprendi muito é “A Era do Capitalismo de Vigilância” de Shoshana Zuboff, socióloga. Mostra como há um enorme processo de transformação de modelos de negócio associado às redes sociais digitais, transformando as pessoas em consumidores cegos de conteúdo e produtores de dados sobre o seu comportamento – facilitando a previsão do seu comportamento, permitindo criar bolhas e uma “colmeia digital” e gerando enormes lucros associados aos dados comportamentais das pessoas, mesmo com consequências éticas e anti-democráticas. E isso implica criarmos novos imaginários para lá da vigilância.