Hotel em Mesão frio pode levar o Douro a perder estatuto de património da humanidade

Mesão Frio
Mesão Frio
Foto por Carlos Cunha, CC BY-SA 3.0 <https://creativecommons.org/licenses/by-sa/3.0>, via Wikimedia Commons
Parecer técnico da Unesco abre caminho a uma futura exclusão do Douro vinhateiro do património mundial, devido a um hotel de cinco estrelas que Mário Ferreira quer construir no lugar da Rede, concelho de Mesão Frio. O Projeto está em consulta pública até dia 29 de janeiro e conta com o “apoio inequívoco” da autarquia socialista.

O Público noticiou hoje que este projecto antigo, retomado pelo empresário Mário Ferreira, irá colocar em perigo a inclusão da paisagem do Douro vinhateiro na lista dos bens classificados, “abrindo caminho para uma futura exclusão da lista de património mundial”, pode ler-se no ofício enviado pelo embaixador José Moraes Cabral, presidente da CNU, para a comissão de avaliação, acompanhando o parecer técnico do Conselho Internacional de Monumentos e Sítios (ICOMOS).

O ICOMOS considera que a construção terá impactos “negativos, diretos, indiretos, certos, permanentes, irreversíveis, de magnitude elevada e não minimizáveis”, pode ler-se na notícia do Público. José Moraes Cabral recomenda assim que o Estado não licencie o empreendimento e que siga as recomendações técnicas da ICOMOS em projetos futuros.

O processo de tentativa de licenciamento deste projeto da sociedade Douro Marina Hotel, propriedade de Mário Ferreira, começou há 22 anos, tendo já sido recusado por duas vezes, a última em abril de 2018, quando foi chumbado devido à Avaliação de Impacto Ambiental. Neste momento encontra-se, novamente, em consulta pública, no portal Participa.pt, até dia 29 de janeiro. 

A insistência no projeto demonstra a fragilidade do processo burocrático em que podem cair as questões de ordenamento de território. Desta vez, Mário Ferreira, submeteu à avaliação ambiental um estudo prévio, em vez de um projeto de execução, fintando uma declaração de desconformidade à semelhança da de 2018. Tenta ainda agora responder a todas as questões levantadas e ao cumprimento do Plano de Pormenor da Rede, um documento aprovado em 2010, onde está contemplado o empreendimento hoteleiro.

No Estudo de Impacto Ambiental em consulta, o promotor minimiza os riscos de cheia e, apesar de admitir que o empreendimento constituiria o elemento de maior expressão volumétrica da zona, descarta a importância de tal facto, considerando-no não “necessariamente negativo” e, segundo o Público, que até se poderá tornar um novo ícone na paisagem.

O parecer da Unesco não concorda com esta posição, sustentado que “o bem do Património Mundial é icónico em si mesmo e acarretará uma competição desnecessária entre a paisagem e a arquitectura. A paisagem patrimonial deve ter precedência aqui, pois esta não é uma paisagem sem personalidade que precisa de elementos icónicos”. Também as medidas sugeridas de mitigação do impacto visual não são bem aceites pelo ICOMOS.

 

Câmara de Mesão Frio tem sido das principais defensoras do Hotel

Os possíveis benefícios socioeconómicos do projeto, como a criação de emprego, são minimizados pelo ICOMOS, que considera que o futuro do turismo numa realidade pós-pandémica é incerto e ainda não foi avaliado. A criação de novos postos de trabalho e a fixação de novos residentes têm sido os principais argumentos da autarquia de Mesão Frio para defender o projeto.

A Câmara socialista tem, de resto, segundo o Público, sido uma das principais defensoras do empreendimento, desde o seu início em 2009. A expectativa terá sido tal que se criaram inclusivamente cursos de formação para preparar a população local e se aprovou em 2010 o Plano de Pormenor da Rede que previa o hotel.

O presidente Alberto Pereira, em declarações ao Público, diz que além de defender o hotel irá levar à próxima reunião “uma proposta no sentido do apoio inequívoco a este projeto”. Apesar de no local não faltar oferta hoteleira, nomeadamente segundo O Plano Intermunicipal de Ordenamento de Território do Alto Douro Vinhateiro.

O império do empresário que inicialmente apresentou o projeto, Carlos Saraiva, sucumbiu às dívidas superiores a 800 milhões de euros, agravadas pela crise económica mundial. Os hotéis ficaram ao encargo dos bancos, regressando depois a Mário Ferreira. O Público tentou contactar Mário Ferreira, que disse não se pronunciar enquanto não existir uma decisão da Comissão de Avaliação que está a analisar o Estudo de Impacto Ambiental. “Quem esperou 22 anos, também espera mais uns dias”, disse.

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