António Minhoto, porta-voz da AZU – Ambiente nas Zonas Uraníferas e também da ATMU – Associação dos Ex-Trabalhadores das Minas de Urânio, participou no painel “Ambiente do Avesso?”, partilhando aquela que tem sido a luta mineira ao longo dos anos, bem como os seus desafios, alertando para os perigos da exploração de urânio, através do exemplo da Mina de Urânio da Urgeiriça.
António Minhoto explica como a questão da radioatividade e dos perigos associados à exposição, não era tida em conta até à década de 80, o que conduziu a uma situação muito grave cujas consequências ainda hoje se mantêm.
Neste processo, os “trabalhadores tiveram um papel importantíssimo porque tinham conhecimento, eram portadores de um know how muito importante”, foram por isso “os primeiros a vir denunciar que a exploração de urânio deixou um passivo ambiental muito grave”.
Foram precisamente os trabalhadores que “tomaram as rédeas da luta, denunciando, lutando, exigindo” e conseguindo que “em 2001 a Assembleia da República viesse obrigar o Estado português, a Empresa Nacional de Urânio e mais tarde a EDM [Empresa de Desenvolvimento Mineiro] para que as minas que estavam abandonadas, que não tinham vedação […] fossem vedadas e lhes fosse impedido o acesso”.
Foram também estas reivindicações que levaram a que se tenha feito um estudo chamado MinUrar. “Os trabalhadores mineiros já estavam contaminados” mas era preciso saber quais os impactos das minas na saúde das populações envolventes. Este estudo “foi importante” e “deu seguimento a outros”.
Percebeu-se que vários técnicos que trabalhavam na mina, muito além dos mineiros, “tinham mortes com cancro”. “Neste momento o estudo que nós temos aponta para cerca de 550 trabalhadores que estiveram até ao fim a trabalhar na Empresa Nacional de Urânio. Cerca de 170 morreram com patologias cancerosas, hoje ainda temos trabalhadores que lutam contra essas doenças”, conta António Minhoto.
Desde 2007, existe um programa que determina “que os trabalhadores têm que fazer anualmente” vários exames. Em 13 anos já se fizeram “mais de 10 mil consultas, estão inscritos cerca de 800 trabalhadores e seus familiares”, entretanto incluídos pela lei pelos riscos de contaminação, ora por habitarem próximos das minas, ora por estarem em contacto com os objetos contaminados, como a roupa, dos familiares que trabalhavam na mina.
Na Urgeiriça, a contaminação também persiste através das casas dos trabalhadores, “que foram feitas com material vindo da mina […] e que estão algumas delas contaminadas”. “Passa-se neste momento um processo muito importante de recuperação dessas casas, o Estado tem que cumprir rapidamente porque está a ser cúmplice! […] Não se pode deixar o Estado saber que os trabalhadores, ou que os moradores da Urgeiriça, compraram uma casa ao Estado, que essa casa não está em condições de poder ser habitável e que eles estão lá a viver”. A ATMU tem estado nesta luta, “denunciando que não pode adiar-se mais este processo”.
Mas “a luta mineira de urânio em portugal” alarga-se “depois à luta internacional”, pois “nuclear não é alternativa”. Ainda recentemente na questão de Almaraz e “destes incidentes que têm acontecido com a Central Nuclear”, a AZU e a “população mineira” têm estado para mostrar que os “perigos são evidentes”, para “dizer que a alternativa não é o nuclear e que a exploração de urânio quer em Portugal, quer em Espanha, quer noutro país, tem que terminar”.
António Minhoto diz ainda que mesmo que se argumente que as condições de segurança são outras, “nós não acreditamos porque sabemos que as partículas não são fáceis de controlar, a exploração a céu aberto altera todo o impacto quer nas águas, quer até no ambiente, e por isso as pessoas que trabalham nessas minas sofrem por inalação direta, ou por ingerirem através de produtos alimentares, e por isso nós estamos em todas as frentes de luta onde se discuta a questão da exploração de urânio”.
Ambiente do Avesso? O panorama ambiental do interior
Associações, Movimentos, Coletivos e Ativistas do Interior partilham as suas perspectivas e lutas pelo ambiente.