A desvalorização da Casa do Douro empobreceu ainda mais a região

Foto por Paula Nunes | Esquerda.net
A Casa do Douro nasce em 1932 com o regime corporativo e é por este encarregue de proteger e disciplinar a produção.

Foram-lhe atribuídos poderes, entre outros, de distribuir o benefício e fiscalizar o vinho na região demarcada. Constitui-se como um sustentáculo da vitivinicultura duriense, pois era o garante do escoamento da produção dos seus associados, na sua maioria pequenos agricultores. A sua extinção foi um processo penoso, algumas vezes premeditado e outras com tiros nos pés e inexorável. A primeira machadada foi dada em 1995 quando foi criada a Comissão Interprofissional da Região Demarcada do Douro (CIRDD), no qual tinham assento, em situação de absoluta paridade, os representantes da lavoura e do comércio, com o objectivo comum de disciplinar e controlar a produção e comercialização dos vinhos da região. Este modelo veio a sofrer nova alteração em 2003 e foi substituído por um Conselho Interprofissional integrado no Instituto dos Vinhos do Douro e Porto (IVDP). Em termos formais, e conforme estabelece a sua Lei Orgânica, a missão do IVDP é a supervisão da viticultura duriense cabendo-lhe a certificação dos vinhos e a disciplina do sector.

A perda de influência da estrutura associativa está também directamente relacionada com o aumento da concentração da produção do vinho do Porto. No presente, cinco grandes grupos controlam cerca de três quartos de um negócio que em 2017 se cifrou em cerca 400 milhões de euros. Os grandes grupos estão a assenhorear-se sobretudo de propriedades de alto valor, reforçando a produção própria dos vinhos destinados às categorias especiais (vintage, late bottled vintage e “Porto” com indicação de idade, produtos que estão a ganhar um peso crescente nas vendas globais). Para as categorias especiais, recorrem cada vez mais à produção própria; e, para os vinhos comuns, compram aos pequenos viticultores individuais e às cooperativas que acolhem as pequenas produções de muitos dos produtores durienses, a maior parte deles com colheitas inferiores a cinco pipas/ano (2500 litros). Daqui decorre uma baixa dos preços pagos à produção.

A situação piorou com o endividamento brutal fruto da aquisição de 40% das acções da Real Companhia Velha, encorajado pelo governo de Cavaco Silva e sucessivas gestões ruinosas. Muita da população a viver no Douro é proprietária de pequenas explorações e sempre tiveram o guarda-chuva da segurança enquanto associados numa estrutura forte como era a Casa do Douro. A reorganização do sector por parte da administração central não soube acautelar os interesses dos pequenos em detrimento dos grandes. Recentemente, uma réstia de esperança, a Assembleia da República aprovou um projeto-lei que restaura a Casa do Douro como associação pública de inscrição obrigatória. O decréscimo da importância da instituição duriense agravará os condicionalismos que sofre a região.

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Natural da freguesia de Selores, concelho de Carrazeda de Ansiães.
Professor do 1º Ciclo do Ensino Básico, mestrado em cultura portuguesa, doutorando em língua e cultura portuguesa. Socio-fundador da Cooperativa Rádio Ansiães e seu diretor entre 1987 e 1997. Colaborador de vários jornais locais e regionais.

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