Chegamos ao tão esperado final de 2020! Ano estranho, cheio de bizarrices e que ficou marcado de forma não muito positiva. O seu mais popular adjetivo foi “atípico” – não sei os leitores, mas a mim a palavra atípico parece-me um eufemismo para aquilo que realmente foi este ano. E assim, quero apresentar a minha breve perspetiva do ano que está agora a findar, que foi, no geral, horrível, mas relativamente agradável para a minha pessoa.
De facto, o ano começou de uma forma nada agradável. Os incêndios na Austrália, em janeiro, destruíram uma parte significativa da 7ª maior área florestal do mundo, afetando principalmente a zona de Nova Gales do Sul, a mais populosa do país. Milhares de hectares de floresta arderam e a vida selvagem viu-se seriamente afetada, levando a que algumas espécies endógenas, como o adorável coala, atingissem o grau de ameaçadas ou quase extintas em poucos dias. O responsável por isto? Como não, as, tão famosas, alterações climáticas. Algo foi feito como contramedida? Como é óbvio, não, pois é bem sabido que vivemos sozinhos na Terra e que basta petróleo para respirarmos.
Em fevereiro, chegou à Europa um vírus estranho e nunca antes visto, em humanos, com origem na cidade chinesa de Wuhan. Acreditou-se a um princípio que o Sars cov-2 teve a sua génese num morcego, depois chegou-se à conclusão que na verdade tinha sido um pangolim. O que realmente importa salientar aqui é que teve origem num bichinho selvagem, que foi capturado e consumido sem necessidade nenhuma, os bichinhos selvagens têm vírus e bactérias desconhecidas para o humano, mas isso pouco importa. “Isso é só os chineses”, diz cheio de um sentimento de superioridade o português comum, no entanto basta ver a famosa foto onde dois psicopatas posam sorridentes junto a uma pilha de 540 animais numa montaria na Azambuja, para perceber que a fixação em matar animais selvagens não é só na China. Na verdade, grande parte dos vírus mais recentes têm origem animal, como a gripe das aves ou a Gripe A (que teve origem nos porcos). Seria uma deixa para mudarmos os nossos hábitos alimentares? Talvez.
Além do confinamento, das muitas mortes e do pânico, o novo coronavírus também aumentou as tensões sociais. Por todo o mundo, todo e qualquer asiático foi alvo de discriminação. Nos EUA, vários cidadãos negros foram assassinados pelas forças de segurança, levando a manifestações violentas (houve muito pessoal que também aproveitou para arranjar uma TV, um sofá, renovar o guarda roupa… tudo pela causa antirracista, como é óbvio), a mais divisão e ao regresso de uns fantasmas nazis que já há muito se pensavam esquecidos. Viu-se também, o crescimento de um oportunismo mesquinho (de repente apareceram celebridades a militar numa causa que nunca lhes importou), para não falar do vitimismo oportunista que atingiu um nível vergonhoso. No mesmo país surgiram movimentos anti vacinas (podem alterar-nos o ADN), anti uso de máscaras (são uma ferramenta do deep state) teorias conspiranóicas no geral, espalhando-se, como um vírus, pelo mundo e chegando em Portugal, onde levou a que o Rossio se tornasse, durante algum tempo, num hospício a céu aberto.
Aproveitando o borbulhar da água, a extrema direita alimentou-se, cresceu e fez mais algumas palhaçadas. Por cá, em julho, os nossos fascistas de estimação organizaram uma manifestação para deixar claro que Portugal não é racista. Manifestação essa formada por…nazis. Sim, aquela malta que tem suásticas tatuadas, faz saudações com a
mão direita levantada e odeia outras raças, etnias, religiões… gente que, claramente, não é racista.
Do outro lado do espectro político, houve uns que se viram superiores ao vírus e levaram a sua celebração anual avante. Deu a ideia de que ninguém está acima das normas sociais, menos os partidos políticos, os partidos políticos estão acima de todos. Não que todos fossem iguais (houve outro partido que suspendeu o seu tradicional acampamento da juventude, como um ato de consciência social), mas o que deu uma má imagem deu, e agravou-se quando o mesmo partido fez birra para fazer um congresso em plena pandemia. No entanto, o mais interessante desta situação foram as, hilariantes e vergonhosas, reações de uns jovens amantes das camisas com mangas arregaçadas e dos mocassins.
De facto, o grande tema deste ano foi o Covid-19, que destabilizou a economia, aumentou grandemente a mortalidade e gerou um pânico que já não era visto há muito (as empresas de papel higiénico agradeceram), fazendo, no entanto, uma pausa para a Fórmula 1 (como qualquer vírus bem-educado deve fazer). Não obstante, outras coisas aconteceram, como a explosão em Beirute que tirou a vida a mais de 150 pessoas, o ciclone Harold que também dizimou, pelo menos, 30 pessoas, ou o assassinato (e tortura) de um cidadão ucraniano pelo SEF, facto que deve envergonhar Portugal por muitos anos, exige a responsabilização dos responsáveis e umas demissões óbvias. Realmente, um ano para esquecer.
Mas nem tudo foi mau. Donald Trump perdeu as eleições americanas, o meio ambiente recuperou um pouco, o Acordo de Paris entra em vigor (esperamos que tenha um impacto significativo). Para mim, foi um ano relativamente positivo, comecei a escrever para o Interior do Avesso, escrevi dois artigos para dois jornais nacionais (Público e Observador), fui entrevistado pela SIC e, mais importante, nem eu nem ninguém da minha família ou amigos próximos foi alvo do Covid.
Apesar de este ano não ter sido o melhor, vamos aguardar o 2021 com entusiasmo e com esperança, pois algo que nos ensinou o 2020 foi a ver sempre o lado positivo e a não perder a compostura, tornando-nos mais fortes e solidários.
Natanael Santos, nascido em Castelo Branco em 1999, vive em Zebreira concelho de Idanha-a-Nova e é estudante de Gestão na ESGIN.