As feridas “emocionais” normalmente enumeradas são: a solidão, o fracasso, a rejeição e a ruminação.
Será difícil imaginar alguém que ainda não tenha sido confrontado com um momento de fraqueza e dúvida durante toda a sua vida, mas a pandemia da covid-19 também proporcionou uma maior preocupação pela saúde mental, sendo que ao confrontarmos estudos recentes que apontam para que metade dos universitários estejam numa situação de “Burnout”, percebemos o impacto que a entrada na vida académica tem na nossa vida. É partindo desta ideia, que é desenvolvida uma reflexão individual, na qual pretendo expor a íntima ligação que a universidade poderá ter com situações de ansiedade e depressão, e de que forma as suas consequências podem ser atenuadas.
É inegável, que a entrada no ensino superior é delicada para qualquer jovem, onde sentimentos de insegurança e descrença acabam por fazer parte da sua rotina. O tempo de adaptação não é igual para todos, e infelizmente, muitos nem o chegam a encontrar, acabando por desistir do curso, ou em situações extremas, colocar um término à vida.
Será fácil para um jovem do Interior Centro, habituado à pacata vida caracterizadora de um concelho com cerca de vinte e seis mil habitantes, moldar-se à desassossegada “invicta”? Uma leitura paradoxal, apontaria a facilidade como um traço predominante, até porque afinal deslocava-me de uma região mais deficitária em serviços imprescindíveis, tais como a saúde, a mobilidade, ou o emprego, para a segunda maior cidade do país, onde o conjunto de respostas aos problemas da população, teoricamente é mais eficaz. Juntamente a isto, a referência aos anos para a conclusão dos estudos, também são descritos “como os melhores da nossa vida”, mas uma análise mais profunda poderá desmistificar esta falácia, pois esta referência não passa de uma generalização. Há vários fatores a ter em conta para que esta afirmação possa ser adequada, e um deles, diz respeito à preparação e aquisição de uma eficaz higiene emocional, que é mais difícil de atingir em zonas caracterizadas pelo desinvestimento. Esta contextualização servirá como mote ao restante artigo.
Ao longo dos primeiros meses de licenciatura lidei diretamente com a ansiedade, permitindo-me perceber que a preocupação pela saúde mental nunca foi vítima do mesmo grau de interesse, comparativamente à física. O medo e a vergonha muitas das vezes não permitem um diagnóstico precoce, contribuindo para uma maior complexidade na análise do impacto real deste problema em Portugal, mas isto é agravado quando os episódios se sucedem por falta de contacto com os cidadãos, e são colocadas a nu, as dificuldades do Serviço Nacional de Saúde. Urge a implantação de medidas orientadas para o doente, e que fortaleçam o papel de todas as áreas de intervenção e diagnóstico, permitindo que haja uma intervenção eficaz. Isto só é conseguido com o correto investimento em estruturas e recursos humanos.
O interior do país enfrenta vários obstáculos que inibem o seu desenvolvimento, muitos deles mencionados já noutras publicações deste portal, mas a falta de investimento na saúde mental é um dos mais assinaláveis. Com o crescente despovoamento e conseguinte isolamento, não deveria ser esta uma questão oportuna nas políticas públicas? O menor acesso a estes cuidados, contradiz-se com a sua necessidade nesta região, em que escasseiam os transportes, os centros de saúde apresentam horários limitados e onde sobressai uma população bastante idosa, que com o passar dos anos vê a sua qualidade de vida deteriorar-se.
Continuamos a assistir a grandes assimetrias regionais no acesso à saúde, e tal como João Semedo e António Arnaut aludem na “Nova Lei de Bases da Saúde”, estes problemas continuarão a aprofundar esta crise, enquanto os profissionais não virem a sua carreira devidamente valorizada. Ao mesmo tempo, assistimos ao descontentamento dos mesmos, que acaba por os empurrar para fora do SNS.
Uma economia regional mais frágil agrava esta debilidade, não se dissociando das questões sociais e ambientais. Segundo a OMS, a saúde consiste num estado completo de bem-estar físico e mental. É então um direito humano fundamental. A carta de Ottawa evidencia o facto de existirem pré-requisitos para atingir esta condição. Destacam-se a paz, a habitação, o salário, um ecossistema estável, o uso sustentável dos recursos, o alimento, a equidade e a justiça social. O atual sistema económico, acaba então por tornar irreal, a ideia de que está ao alcance de todas as pessoas atingir esta condição.
Enquanto o combate à origem desta problemática não constituir uma prioridade, as universidades devem assumir uma posição de discordância face ao ambiente competitivo e de pressão verificado neste grau de ensino, ao mesmo tempo que as preocupações dos estudantes não devem ser banalizadas. Hoje, mais do que nunca, as instituições devem apostar em novas ferramentas de apoio psicológico, permitindo o surgimento de novos espaços de trabalho nesta área, e fazendo das universidades espaços mais seguros, e onde é prestada uma grande atenção aos conflitos que produzimos com nós próprios.
Pedro Mesquita, tem 22 anos e reside no Fundão.
É estudante de Ciências do Desporto na Faculdade de Desporto da
Universidade do Porto.
Membro da Comissão Coordenadora Distrital de Castelo Branco do BE e
elemento do Conselho Municipal da Juventude do Fundão.