E as redes sociais nos dias que precederam as comemorações da data encheram-se de posts didáticos sobre estas diferenças, procurando ressaltar o salto socialmente emancipador que representa o 25 de abril em relação à ditadura salazarista.
Se pensarmos que a liberdade e a democracia deviam estar de tal modo presentes na vida coletiva tal como o ar que respiramos é igualmente de refletir na necessidade que sentimos de explicar por que razões as “conquistas de abril” nos são tão importantes. Ainda assim há um equívoco que importaria esclarecer. A força do 25 de abril, e deste em particular, não se esgota nas celebrações daquilo que a revolução dos cravos nos trouxe, na sua cisão com o passado fascista, na mera e ritualista enumeração das suas vitórias e respetiva monumentalização.
E apesar de ser uma data tão especial como o é o dos 50 anos da sua realização, por detrás do número avassalador que trouxe até às ruas está o contexto económico, social e político concreto. Não apenas os 50 fascistas com representação parlamentar, mas, também, e ainda mais importante, a precarização das relações laborais, o colapso ambiental, a inflação, o preço das casas, o SNS em rutura, a desestabilização mundial provocada pelas guerras permanentes… enfim, todas as condições que nos permitem uma vida digna em comunidade, que fazem com que esta existência coletiva tenha sentido, e que estão sob ataque cerrado, numa investida reacionária muito complexa e extremamente dura.
Por isso a centelha que fez destas celebrações um momento tão especial e inspirador não pode nem deve ser dissociada do campo de combate particular em que se inscreve. Com o 25 de abril não se rememora apenas o que já foi feito até aqui, mas, muito mais significativo, a vontade popular que é preciso recuperar para “fazer o que ainda não foi feito”. Não é o passado que o 25 de abril glorifica é o futuro que ensaia nos combates do presente. É a representação da única frente popular imaginável para fazer frente aos desafios colossais que atravessam o frágil tecido do nosso tempo. Talvez o mais importante que fica destas comemorações seja a reabilitação do poder de acreditar.
Nasce em 1986 e habita nesse território geográfico e imaginário que é o Interior. Cresce em Viseu e faz a sua formação universitária na Covilhã, cresce tendo a Serra da Estrela como pano de fundo. As suas áreas de interesse académico são a filosofia, a política e a literatura. Actualmente está a terminar um doutoramento em filosofia.