As Câmaras Municipais de Castelo Branco e do Fundão e a Direção Regional de Agricultura do Centro acordaram em apresentar uma candidatura para um financiamento de 15 milhões de euros destinado a introduzir regadio em 2 000 hectares, metade em cada concelho, a partir da albufeira de Santa Águeda/Marateca.
De acordo com afirmações do presidente da Câmara de Castelo Branco, serão desviados para rega até 8 hectómetros cúbicos, por ano, do potencial de armazenamento de 34,2. O consumo público no concelho de Castelo Branco, e partes de três concelhos circundantes, é de 6,5 hectómetros cúbicos por ano. Ou seja, a albufeira, que é definida pelo seu Plano de Ordenamento (POASAP) com “a finalidade primária de abastecimento de água para consumo público”, irá utilizar mais água (8 hm3/ano) para alimentar este projeto de regadio do que para corresponder à sua principal razão de ser. Isto, se a candidatura vier a ser aprovada pelo Governo. Estou farto de repetir que o incrível já não existe no meu dicionário.
Citando ainda o presidente da Câmara de Castelo Branco, “esta barragem não foi construída apenas para consumo humano, previu o cenário de regadio.” Na verdade, o POASAP não fala em regadio e, muito menos, em regadio com esta dimensão e com os objetivos previsíveis de grande intensividade da sua exploração.
Conclusão: a extração de água para regadio, agora projetada pelos dois municípios, inverte as prioridades estabelecidas introduzindo-a como atividade de maior utilização da água da albufeira. Não é difícil prever como este tipo de disposições se desenvolverá no futuro, se a candidatura for aprovada. Necessidade gera necessidade: transformado em primeiro consumidor, este regadio determinará as dinâmicas futuras da utilização da água na albufeira em desfavor crescente do abastecimento público.
Quando a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) autorizou a implantação de um cerejal com 17 hectares na zona de proteção da barragem, deduzi que não irá impedir que, no futuro, a albufeira venha a ser cercada por mais culturas intensivas. No caso desta iniciativa dos dois municípios, não nos é revelada a localização dos 2 000 hectares que serão regados pelas águas do rio Ocreza ali retidas. Situando-se, como presumo, na sua bacia, os escoamentos e transportes de materiais, provindos de novas culturas intensivas, irão afluir à albufeira com cargas nocivas de fósforo, pesticidas, inseticidas, herbicidas e substâncias orgânicas que aumentarão significativamente as fontes de eutrofização e de destruição do equilíbrio (ainda) tratável das suas águas para consumo público.
Para mais, não podemos esquecer o quadro de diminuição, já em curso, da precipitação atmosférica decorrente das alterações climáticas na sub-bacia hidrográfica do Ocreza. Previsivelmente, irá dificultar muito a função primeira de abastecimento público da albufeira. E acentuará as dificuldades, se for secundarizada com a sobrecarga de uma nova função de extenso regadio, função não identificada pelo POASAP e que passará a primeira utilização em volume de água extraída.
A água é um bem fundamental; ninguém formalmente o nega. Mas o negócio da água é outro dos objetivos que a avidez do deus dinheiro persegue. Nunca será demais lembrar que falo de uma albufeira de águas públicas protegidas. Não pode ficar à disposição de quem quer realizar empreendimentos que contendam, direta ou indiretamente, com a sua intocável finalidade prioritária.
Nasce em Castelo Branco em 1944. Em 1961 vai estudar Físico-Químicas para a Universidade de Coimbra onde com a crise e a repressão académicas nasce a sua consciência política. No ano de 1969 integra os quadros do Serviço Meteorológico Nacional. Mobilizado para a Guiné Bissau, consegue no entanto ser destacado para Timor-Leste, onde permanece entre 1973 e 1974 a chefiar o Serviço Meteorolóqico.
Em 1984 passa a ser um dos rostos da informação meteorológica na RTP, e dez anos mais tarde da TVI, onde permanece até 1998. Regressa à sua cidade natal em 2002 para tentar desenvolver um projeto-piloto de regionalização de atividades meteorológicas.
É autor dos livros “Mudam os Ventos Mudam os Tempos – Adagiário Popular Meteorológico” (1996), “Voltar a Timor” (1998), “Podia Ser de Outra Maneira (2000) e dos livros de poesia "Corpo Aberto" (2016) e "De muitos ventos e utopia" (2018).
Com um currículo extenso, podemos resumir a vida do “poeta do tempo” como: meteorologista e cidadão no tempo que lhe calhou nesta vida de entre duas noites.Em 1984 passa a ser um dos rostos da informação meteorológica na RTP, e dez anos mais tarde da TVI, onde permanece até 1998. Regressa à sua cidade natal em 2002.
É autor dos livros “Voltar a Timor” (1998), “Podia Ser de Outra Maneira (Imagem do Corpo)” (2000), e da antologia “Mudam os Ventos Mudam os Tempos – Adagiário Popular Meteorológico” (2002).
Com um currículo extenso, podemos resumir a vida do “poeta do tempo” como: meteorologista e cidadão no tempo que lhe calhou nesta vida de entre duas noites.