Em 1963, Martin Luther King fez um discurso icónico intitulado “Eu tenho um sonho”. Passadas décadas, ainda lutamos pelo sonho de um mundo de igualdade, onde não exista julgamento ou preconceito, seja pela cor da pele, credo, nacionalidade, orientação sexual, identidade de género. Um mundo onde cada ser humano possa ser quem realmente é e possa oferecer o que tem de melhor à sociedade. Um mundo onde olhemos mais para o que nos une, ao invés no que nos separa.
Mas este sonho só poderá ser alcançado com uma introspecção profunda do que é ser ser humano a um nível individual. É necessária uma revolução social que começa dentro de nós próprios. Só quando reconhecermos as nossas fraquezas, as nossas faltas, o que alimenta o nosso ego, é que poderemos contrariar a parte mais negativa em nós, alimentar a nossa consciência e nos aproximarmos mais do lugar do nosso semelhante.
Muitos dizem que o dinheiro é a raiz de todos os males. Mas na realidade o dinheiro é neutro, meramente uma forma de obter produtos e serviços, nada mais. O problema reside no amor ao dinheiro, a ganância, a ideia de que quantos mais dígitos tivermos na conta bancária, mais poderosos e especiais somos. Para mim, a questão é, qual é a falta que se pode sentir intrinsecamente para se ter uma necessidade de superioridade? O quão pequeno alguém se deve sentir para ter a necessidade de humilhar, julgar e negar os direitos humanos mais básicos a terceiros?
A imediata correlação entre dinheiro e poder é algo que existe à séculos. E ainda não aprendemos que somos meramente mais uma espécie deste planeta, com tanto direito em o habitar como qualquer outra espécie que nele habita. E que o nosso início e o nosso fim é e sempre será idêntico, independentemente da quantidade de riqueza que possamos ostentar.
Num mundo onde 1% da população mundial detém quase metade da riqueza global e há seres humanos que não têm as necessidades mais básicas atendidas, onde milhares de pessoas morrem à fome, de frio, de violência, onde idosos têm de decidir entre a alimentação ou a medicação, algo não está, obviamente, bem.
Quantas pessoas morreram e morrem em guerras começadas por soberba, ganância, fanatismo ou necessidade de poder? Quantas pessoas são vítimas de violência física, mental, sexual ou psicológica?
Gandhi disse “sê a mudança que queres ver no mundo”. E é, dentro de nós, individualmente, onde essa mudança deve começar. Somos todos seres imperfeitos, com egos e todos erramos. Mas acredito na redenção, em segundas oportunidades. Acredito que temos a capacidade de olhar para dentro de nós e reconhecer o que deve ser alterado, ou controlado, em prol de um mundo justo para todos, um mundo de igualdade, onde trabalhamos em cooperação, ao invés de em competição e onde somos aceites por quem somos.
Tenho pessoas à minha beira de quem, e por quem, estou muito grata, que me inspiram, que me fazem querer ser melhor, como a minha mãe, os meus dois sobrinhos e os seus cônjuges. Mas encontro indivíduos no meu dia a dia que me ajudam a manter esta chama acessa.
Um mundo onde seja possível viver e não meramente sobreviver. Um mundo onde cada um de nós dá o que tem de melhor, criando um futuro próspero, justo e sem desigualdade. Um mundo onde não é a ganância, o ódio, o rancor, a mentira, maldade, a violência, a divisão que prevalece, mas sim o amor, a paz, a honestidade, a igualdade, o respeito, a dignidade e a fraternidade.
Desde muito jovem que tenho alguma dificuldade em compreender a sociedade e, à medida que fui amadurecendo, esse sentimento não mudou. Assim como não mudou o meu sonho de finalmente pararmos de lutar as mesmas lutas e de criarmos as condições para um mundo melhor para todos. Todos temos livre arbítrio e podemos escolher ser melhor, fazer melhor.
Sim, eu também tenho um sonho. Um sonho utópico poderão dizer, irrisório para muitos, mas não deixa de ser o meu sonho, o sonho de um mundo diferente, sem preconceitos ou desigualdades, baseado na paz, dignidade, liberdade, fraternidade e no amor e onde não tenhamos de viver sufocados mas onde finalmente possamos respirar. O sonho que possamos, como humanidade, sarar as feridas do nosso passado e começar a escrever a nova história do nosso futuro.
Elisabete Frade/Shenhua
Nasceu em Évora em 1981 e desde então passou por Arraiolos, Mem-Martins, Coimbra, Lisboa e Viseu.
Tirou um curso profissional de Turismo, um curso de Inglês para Empresas e uma Licenciatura em Relações Internacionais, especializando-se em Estudos Europeus, estagiando na Câmara do Comércio da Itália.
Morou quase uma década na Holanda, trabalhando numa empresa internacional organizadora de conferências para empresas e, mais tarde, na área da tradução para empresas internacionais e privados, tendo ido viver para a Escócia.
Regressou a Portugal e desde então é a cuidadora informal da sua mãe idosa.