A pobreza da exploração dos recursos minerais

Sempre vivi com a firme certeza que a Terra é um planeta em que os seus subsistemas: Biosfera, Atmosfera, Geosfera e Hidrosfera estão interligados e são finitos. Por outro lado, sempre achei que se a ação humana os alterava contribuindo para o seu fim e degradação, a ação humana devia ser modificada.
Mas, cada vez que se procura expor o que é óbvio esbarra-se com uma série de argumentos que culminam em última instância com a “verdade final” de que esgotar recursos, alterar a Geosfera, a Hidrosfera, a Atmosfera, a forma como estão interligadas e como afetam a Biosfera é “um mal necessário para criar riqueza e emprego”, bem como que é irrefutavelmente necessário por “questões económicas”. Portanto, para falar desta corrida incessante a requerimentos para pesquisa, concessões e contratos de exploração por parte de empresas do sector mineiro, para diversos elementos químicos, predispus-me a uma intensa pesquisa e revisão de matérias académicas, porque seria necessário para uma boa argumentação um inteiro domínio dos conceitos e conhecer bem a explicação científica dos fenómenos envolvidos.
Mormente toda a importância de explicar que os elementos químicos, ditos necessários à evolução tecnológica, estão contidos em determinados minerais que fazem parte de determinadas rochas, e que para os obter é preciso esventrar a Terra, retirar as rochas e por processos físicos e químicos extrair os elementos químicos; pese toda a explicação necessária para demonstrar o quão impactante será essa atividade, bem como os diferentes tipos de impactos – sociais, ambientais, culturais, espaciais e económicos – ou ainda de que forma eles serão signicativos…

Então, pressupõe-se que o Couto Mineiro do Bessa, um dos complexos mineiros existentes no NW Transmontano, localizado no que designa Zona da Galiza Média e Trás-os-Montes, e que corresponde a uma faixa de metassedimentos do Silúrico e do Devónico1, enquadrados pelos maciços graníticos de Montalegre e Chaves, têm potencial para a existência de pegmatitos do tipo LCT (Lítio, Césio, Tântalo), elementos que hoje têm grande interesse económico. Ora, como Smith explica o valor propriamente dito é resultado da interação simultânea do comportamento de todos os indivíduos, sejam eles consumidores ou produtores na economia. Portanto, é preciso termos um olhar crítico sobre o que nos rodeia. Por vezes repetem-nos tantas vezes que um bem é fundamental para o nosso bem-estar e qualidade de vida que até acreditamos que não seremos felizes sem ele, mesmo que isso implique não termos ar para respirar nem água potável para beber.

De acordo com a teoria neoclássica da economia o homem apropria-se da natureza, controla-a e controla totalmente o processo de produção, usa os recursos naturais sempre com o objetivo de obter maiores ganhos e maior crescimento económico. Isto pressupõe que o capital natural pode ser substituído infinitamente pelo capital material, ou seja, basicamente podemos esventrar a terra e alterar todos os sistemas terrestres (atmosfera, biosfera, hidrosfera, geosfera) que posteriormente tudo poderá ser substituído pela inovação tecnológica.

No fundo, os que admitem que a exploração de recursos naturais é um “mal necessário por causa da economia” são apologista dessa sociedade neoclássica que procura a acumulação de capital, que considera que a sociedade tem necessidades ilimitadas e que essas requerem uma oferta cada vez maior de bens, portanto, para perpetuar o padrão de crescimento económico, é necessário a utilização intensificada dos recursos naturais que se vão degradando e esgotando. No fundo, o comportamento individualista para satisfazer as necessidades individuais e o comportamento irracional do colectivo em que cada homem tende a aumentar a apropriação do bem comum leva inevitavelmente à destruição ambiental, à exploração predatória e à intensificação da pobreza.

Fazer apologia de que a exploração de recursos minerais pode trazer benefícios e desenvolvimento local não se enquadra, de forma alguma, nos objetivos de um desenvolvimento sustentável que integra as vertentes social, económica, ecológica, espacial e cultural da sustentabilidade.
Desde 1983 que a Organização das Nações Unidas (ONU), que criou a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, se debate com as questões críticas relativas ao meio ambiente e propôs novas formas de cooperação internacional, de modo a orientar as políticas e ações no sentido das mudanças necessárias. Mudanças essas que requerem de uma vez por todas um novo entendimento no planeamento governamental em que não se procure apenas o crescimento económico, mas que reconheça que é necessário reverter-se em desenvolvimento económico e social que possibilite maior equidade social, sem deixar de considerar o meio ambiente.

Mas, experimentemos reflectir um pouco: segundo a Savannah Resources no norte de Portugal há a maior reserva de Lítio da Europa. Por outro lado, diz-se que esse lítio faz falta para a crescente indústria de carros elétricos e que até 2025 o norte de Portugal pode abastecer em cerca de 40% o mercado europeu.
Pergunto, então, aqueles que se referem à contestação local que se opõem à exploração dos recursos mineiros como um fenómeno NIMBY.

Para quem são necessários tantos automóveis elétricos? Quanto lítio, ouro e afins será suficiente extrair das entranhas da Terra para satisfazer as necessidades de alguns? Quanto será suficiente? Qual será o tamanho do buraco da Terra, no final?

Precisamos, urgentemente, mudar de paradigma. Precisamos de viver necessariamente em harmonia com a natureza, reconhecer nesta o seu valor intrínseco, reconhecer e perceber a igualdade entre espécies, procurar a autorrealização para além dos objetivos materiais, ter consciência de que o planeta tem recursos limitados, fazer uso apropriado da tecnologia e reconhecer que esta não resolve todos os problemas, nomeadamente o da contaminação; fazer um consumo racional e reciclar; respeitar as Bio-regiões e reconhecer as tradições e culturas das minorias, ou seja, saber viver uns com os outros.
Como isto é possível? É possível se mudarmos o paradigma, se houver vontade política para implementar as mudanças estratégicas necessárias, nomeadamente no investimento de serviços públicos, como por exemplo os transportes. Se tivermos uma boa rede de transportes públicos usaremos menos automóveis e causaremos menor impacto ambiental. Se tivermos bons serviços de saúde, boas escolas, habitação condigna… Não seria necessário esgotarmo-nos a trabalhar para conseguir satisfazer essas necessidades. Assim, se não trabalhássemos tantas horas isso implicaria menos custos e mais tempo livre, melhor qualidade de vida…

Claro que fazer apologia da redução do consumo pode não ficar bem aos olhos de todos, essencialmente daqueles que querem enriquecer, daqueles a quem não importa a igualdade nem a injustiça social. Mas, inclusivé esses deviam pensar que a Terra é como um enorme organismo vivo do qual também fazemos parte, que cada vez que esventramos a Terra lhe tiramos vitalidade e um dia nem os senhores que mandam no Mundo terão Mundo onde mandar.
Como já disse antes, vender um rim é capaz de dar uma fortuna, mas seria uma estupidez vender os nossos rins e comprar uns biónicos.

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Nasceu em Chaves no ano de 1979.
Licenciada em Ensino Biologia-Geologia pela Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, no ano de 2001. Mestre em Ciências de Educação - Especialização em Animação Sociocultural pela UTAD. Frequentou o 2.°ciclo do curso Bietápico de Licenciatura em Engenharia do Ambiente e do Território do Instituto Politécnico de Bragança.
Lecionou, como docente contratada do grupo de Biologia e Geologia, em várias escolas do país.

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