A candidatura da Marisa Matias e os resultados abaixo das expetativas
Os números estão à vista de todos. Os resultados da candidatura da Marisa Matias não foram o que todos estávamos à espera.
- Sabemos que Marisa ganha muito com o contato na rua, é no meio das pessoas que ela faz política, lado a lado. Devido à pandemia que estamos a passar, as mobilizações tão frequentes nas campanhas eleitorais foram trocadas, no caso da candidatura da Marisa, por ações muito reduzidas e por comícios virtuais (neste campo, a candidatura soube inovar sendo os únicos a apostar seriamente nesta vertente).
- A candidatura de Ana Gomes, uma candidatura puramente de combate interno do Partido Socialista e não de proposta para o país, levou a que a pressão do voto útil contra o André Ventura recaísse todo na socialista. A pergunta é: o que se faz agora com os votos da Ana Gomes?
- A Marisa trouxe à campanha os temas essenciais para o país: Ambiente, ruralidade, SNS, direitos dos trabalhadores, mas a campanha mediática movimentou-se por outros lados e aí a candidatura da Marisa teve um ponto para salientar. O movimento #VermelhoEmBelém levou à mobilização de milhares de pessoas contra o discurso machista e sexista de André Ventura, mas de facto, esta mobilização não foi suficiente.
- É importante não extrapolar os resultados das presidenciais para umas eventuais eleições legislativas, numa sondagem à boca de urna no domingo para perceber qual seria o sentido de voto dos eleitores nas legislativas, os cidadãos colocam o Bloco com 7,2%. O Bloco continua a estar presente em Portugal, como no distrito de Viseu.
- Os debates também não correram bem, sendo praticamente todos os candidatos, inclusive a Marisa, capturados pelo discurso agressivo e violento de André Ventura
A Esquerda e o abandono irresponsável do Partido Socialista
A Esquerda, no seu conjunto, teve um resultado pouco favorável. Muito por culpa do Partido Socialista, que se negou a participar neste ato democrático, de forma irresponsável,e entregou a eleição de bandeja a Marcelo Rebelo de Sousa.
Não me parece que união às Esquerdas na primeira volta trouxesse alguma vantagem porque essa candidatura única iria perder mobilização, mas também pelas divergências de fundo. Das sondagens que se têm visto, tanto Bloco como PCP, conseguiram manter o seu eleitorado de base, mas não saíram daí, ao contrário do que aconteceu com a candidatura da Marisa em 2016.
A candidatura da Marisa continua distribuída de forma mais ou menos homogénea por todo o país, ao contrário de João Ferreira que concentra os seus votos no Alentejo e nos distritos de Lisboa e Setúbal.
A Esquerda, e o Bloco, precisa de um momento de reflexão para encontrar formas de lutas eficazes contra o ressurgimento da Direita opressora, xenófoba e racista. Sobretudo nos distritos do Interior que têm sido continuamente abandonados pelo centrão político.
A Direita e a sua responsabilização pela ascensão do André Ventura
Muito se tem falado do PCP, do Alentejo e da transferência de votos para o Chega. De facto, o Chega tem boa votação em territórios comunistas, mas analisando os números podemos observar que o PCP perdeu 7 mil votos no Alentejo relativamente à eleição presidencial de 2016.
O Chega reforça o seu discurso e atuação política alimentando o ódio, colocando cidadãos contra cidadãos. É esta a estratégia política do Chega, que vai buscar votos a todos os quadrantes, mas parece-me que aqui houve um erro estratégico da Direita democrática (CDS e PSD).
Tanto PSD como CDS estiveram 5 anos a criticar o mandato do Marcelo, acusando-o de esquerdista e de estar a suportar a Geringonça. Isto criou um sentimento de traição em muito eleitorado da direita tradicional que acabou por ficar órfão quando os dois partidos decidiram apoiar a recandidatura de Marcelo.
Uma sondagem mostra que 33% do eleitorado do PSD nas legislativas votou em André Ventura, provavelmente por não ter ninguém forte no campo da direita democrática. O CDS perdeu aqui uma boa oportunidade de tentar rejuvenescer o seu eleitorado e o seu discurso.
Não tenham dúvidas de que quem fez e faz crescer o eleitorado do Chega e do André Ventura são os votantes de direita e a estratégia política falhada de PSD e CDS. A direita democrática não pode enfiar a cabeça na areia.
PSD e CDS não têm nenhum motivo para cantar vitória com a reeleição de Marcelo, com o apoio do António Costa e de uma parte do PS.
Artigo publicado em Centro Notícias
Diego Enrique Rodrigues Garcia, nasceu no dia 1 de Agosto de 1992 em Ourense, na Galiza. Desde 2009 que reside continuamente em Portugal, na região da Beira Alta.
Ativista social e independentista galego, está ligado ao movimento associativo na área ambiental, do bem-estar animal e da juventude. Dirigente do Bloco de Esquerda no distrito de Viseu
Atualmente a realizar uma licenciatura em Estudos Europeus na Universidade Aberta.