O distrito de Bragança tem vindo a sofrer com as alterações climáticas, nomeadamente nas culturas que são arrasadas e nas catástrofes que os incêndios têm causado (vejam-se os exemplos da queda de granizo em Mogadouro e dos hectares consumidos pelos fogos em Vinhais, Carrazeda de Ansiães, Alfândega da Fé). É urgente atuar no terreno e deixar de lado as poucas tentativas que têm sido feitas. É urgente preencher as lacunas de um distrito fortemente afetado pelas migrações do interior para litoral e pela falta de investimento em setores estratégicos para o desenvolvimento da região.
É urgente transformar a agricultura!
É necessária uma mudança no paradigma. É importante o apoio aos agricultores que apostem numa agricultura diferenciada, contra a produção intensiva, limitando os fitofarmacêuticos. Estas medidas só serão possíveis com uma Política Agrícola Comum (PAC) que sirva os agricultores e não apenas os grandes latifundiários.
O Artigo 39º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia especifica que a PAC deve, entre outros, (i) incrementar a produtividade agrícola assegurar um nível de vida equitativo à população agrícola e (ii) assegurar um nível de vida equitativo à população agrícola. Aquilo a que temos assistido é a uma destruição da pequena agricultura, em proveito das grandes sobreexplorações e produção em massa a qualquer preço. Necessitamos de um reforço no financiamento nas culturas arrasadas pelas alterações climáticas e a desburocratização do acesso a fundos comunitários.
Precisamos de uma agricultura biológica, onde exista uma sinergia entre o clima, o solo e os seres vivos. É necessário um reforço do capital humano que responda às necessidades técnico-científicas, de um capital físico que permita melhorar a atividade agrícola e de capital financeiro que limite os fitofarmacêuticos e promova a diversidade da floresta.
Uma nuvem de fumo que teima em não desaparecer.
As alterações climáticas atingem, todos os anos, Bragança, fustigando-a com fogos e intempéries. São necessárias medidas democráticas que protejam as nossas florestas dos fogos e protejam aqueles que mais sofrem com os fogos. As medidas que têm sido oferecidas não são suficientes. É preciso mais. Só depois dos grandes fogos de 2017 é que se começaram a tomar as devidas medidas para a proteção da floresta e das populações. Muitos dos fogos que deflagram têm início em território abandonado. Apesar da Lei da limpeza dos terrenos, não foi suficiente. O estado português só tem 3% da propriedade florestal. É imperativo o aumento da propriedade pública florestal para haver um trabalho de intervenção real no ordenamento do território e uma reflorestação nacional que reduza a área de eucalipto. Precisamos de defender o território. Precisamos de defender a fauna e a flora dos nossos Parques Naturais do Montesinho e do Douro Internacional.
É preciso um investimento num corpo especializado no combate aos incêndios
Nenhuma destas medidas é alcançada se não investirmos num corpo especializado. Por um lado, é necessária a recuperação do Corpo de Guardas Florestais e Vigilantes da Natureza. Por outro, é impreterível um aumento do financiamento das corporações de bombeiros profissionais por parte do poder central e que o financiamento concelhio seja fixo, não estando dependente dos responsáveis no poder local e da sua boa vontade e/ou interesses políticos. Essa falta de investimento leva à dificuldade no recrutamento de profissionais. Urgem medidas que visem o aumento nos recursos humanos, e, por inerência, a acreditação do curso, e que as equipas de prevenção estejam no terreno, mesmo nas épocas baixas.
Aliar a ciência ao território
O ranking internacional U-Multirank considerou o Instituto Politécnico de Bragança (IPB) como o melhor politécnico de Portugal. Não é apenas um orgulho para o distrito. É o caminho para a sustentabilidade. Só com uma união das unidades I&D (investigação e desenvolvimento) e com dos setores da agricultura e floresta conseguiremos proteger o distrito. O IPB tem, hoje, uma panóplia de Cursos Técnicos Superiores Profissionais, Licenciaturas e Mestrados com uma importante componente prática de campo e laboratorial que permite que os alunos conheçam o território. É necessário que o Ministério da Agricultura reconheça o valor que o IPB tem na profissionalização de técnicos na agroecologia, na profissionalização de produtores e trabalhadores agroflorestais e que o IPB se torne na instituição de ensino superior de referência nacional e internacional.
Recentemente, o Centro de Investigação de Montanha e o Centro de Investigação em Digitalização e Robótica Inteligente foram avaliados com uma classificação de Excelente por parte da Fundação para a Ciência e a Tecnologia. A par, o Centro de Investigação em Educação Básica e a Unidade de Investigação Aplicada em Gestão foram avaliados com uma classificação de Bom. Este reconhecimento só é possível com um financiamento no investimento nas unidades de I&D, pois só desta forma conseguimos atrair investigadores, e, por conseguinte, consolidar um forte corpo docente que não fique refém da contratação precária. Para isso, é crucial que o IPB possa atribuir o grau de Doutor.
Estas medidas só irão contribuir para a fixação de jovens no território e que o fosso entre o litoral e o interior seja cada vez menor.
Linguista, investigador científico, feminista e ativista social.
Nascido em Lisboa, saiu da capital rumo a Terras de Trás-os-Montes e cedo reconheceu o papel que teria de assumir num interior profundamente desigual. É aí que luta ativamente contra as desigualdades sexuais, pelos direitos dos estudantes e dos bolseiros de investigação. Membro da Catarse - Movimento Social, movimento que luta contra qualquer atentado à liberdade/dignidade Humana. Defende a literacia social e política.
(O autor segue as normas ortográficas da Língua Portuguesa)