Atrevi-me a alterar o mais famoso slogan/grito de protesto que vem no Manifesto Comunista de Karl Marx e Friedrich Engels, porque Portugal deixou de ser dos poucos países europeus onde os partidos de extrema direita, neofascistas, ocuparam o espaço político e estão hoje representados nos órgãos democráticos. 45 anos depois do fim da ditadura do Estado Novo, há um partido que conseguiu eleger um deputado pelo círculo eleitoral de Lisboa. Mais de 66000 portugueses votaram num partido com um discurso populista, antidemocrático, xenófobo, racista e homofóbico.
Das propostas deste partido, constam o fim dos serviços públicos, como a saúde e a educação. Direitos esses consagrados na CRP, nos artigos 64º, 73º e 74º, construída por democratas que derrubaram um Estado, já pouco, Novo. Das propostas, constam, ainda, o fim da despenalização do aborto e o fim do direito à mudança de sexo. Assim como os E.U.A e o Brasil fizeram, este partido, baseando-se em preconceitos ideológicos, quer transferir a embaixada portuguesa de Tel-Aviv para Jerusalém.
1324. Este é o número de transmontanos (791 em Vila Real e 533 em Bragança) que votaram neste partido. Todos conhecemos o conservadorismo que existe num interior há muito esquecido. Todos conhecemos as opções políticas que há 45 anos se têm tomado, deixando a região longe de Portugal e longe da Europa. Todos conhecemos os problemas que a região enfrenta e todos sabemos que nada tem sido feito para alterar esse paradigma.
Os votos direcionados para partidos de extrema direita não são a alternativa a este paradigma. Essa alternativa está, essencialmente, presente nos programas eleitorais à esquerda e nos programas que preveem um crescimento do estado social para ditar o fim das desigualdades sociais e territoriais. O Bloco de Esquerda de Bragança apresentou-se a estas eleições com um programa fortemente marcado pela coesão territorial e pelo fim das desigualdades sociais. Esse programa refletiu-se no crescimento do partido em Bragança (também em Vila Real e, essencialmente, por todo o interior) e na confiança depositada pelos quase 4000 brigantinos.
É neste ponto que os partidos da esquerda democrática se devem debater. Por um lado, o crescimento do apoio à esquerda no interior e, por outro, um reforço da luta nas políticas de coesão. A população do interior continua, embora de forma menos acelerada, a apostar na esquerda democrática para reivindicar aquilo que pertencer a quem no interior habita e trabalha.
Entrámos no momento da reviravolta
Este é o momento de atuar. Está nas nossas mãos fazer a diferença e levar a força da esquerda para as ruas. É preciso mostrar que o caminho se faz para a frente, mas nunca para trás. Só em 2015 iniciámos a desmistificação do que foram os terrores do Estado Novo com o Museu do Aljube – Resistência e Liberdade e, recentemente, com o Museu da Resistência e da Liberdade, em Peniche. A Norte, o projeto Museu da Vergonha, que tem como objetivo a criação de um Museu da Resistência no Porto, está a ganhar corpo e promete ser um museu de memórias das lutas antifascistas.
“Brincar com o fogo”. É o que a Câmara de Santa Comba Dão está a fazer. Tratar, descuidadamente, de um tema tão fraturante na sociedade portuguesa. Estamos a falar da criação de um museu em “memória” de um ditador, quando, ainda, os programas escolares não sabem como abordar o tema de forma crítica. E esse é o papel dos museus que abordam a temática da memória da luta antifascista e não a memória dos bens pessoais de um ditador.
Este é o reflexo de um desinvestimento na educação, no património, na cultura e na sociedade. Aqueles que deveriam ser os principais portais da democracia são, tantas vezes, um entrave. É o momento de valorizar a memória histórica da resistência ao Estado Novo em Portugal, promovendo uma contracorrente democrática que difunda uma mensagem de união dos povos.
Hoje, o caminho deve ser o de concentrar esforços em desconstruir as ideias antidemocráticas. É tempo de juntarmos forças à esquerda.
Hoje, é o tempo de gritarmos: Socialistas do mundo, uni-vos!
Linguista, investigador científico, feminista e ativista social.
Nascido em Lisboa, saiu da capital rumo a Terras de Trás-os-Montes e cedo reconheceu o papel que teria de assumir num interior profundamente desigual. É aí que luta ativamente contra as desigualdades sexuais, pelos direitos dos estudantes e dos bolseiros de investigação. Membro da Catarse - Movimento Social, movimento que luta contra qualquer atentado à liberdade/dignidade Humana. Defende a literacia social e política.
(O autor segue as normas ortográficas da Língua Portuguesa)