Falta tudo, menos vontade

Foto de Vila Pouca de Aguiar – Município | Facebook
Não sei, miraculosamente, nenhuma fórmula mágica para transformar Portugal num território coeso, em que o Interior, as Ilhas e o Litoral sejam uma realidade equitativa e plena nas oportunidades. O que sei é que a magia não existe e não acredito em milagres. Resta-me, consequentemente, ser objectivo e pragmático, manhãs de nevoeiro já muitas houveram e muitas mais virão, Sebastião é que não.

Quando decidi que não iria fugir das privações destas Terras, seduzido pelos sirénicos encantos do Litoral, fi-lo consciente de que tal deliberação acarretaria consequências infaustas; não obstante, fi-lo de coração cheio pelo amor que tenho às Terras que “me deram à luz” e donde, dês sempre, inspiro a vida. Fi-lo consciente de que não poderia, nem deveria baixar os braços, enquanto via familiares, antigos colegas de escola, e outros amigos, deixar para trás esta vila-cidade desolada pela falta de oportunidades e serviços. Fi-lo com a certeza e ciente de que era uma decisão correcta, apesar de difícil, e fi-lo porque é preciso lutar no presente, para que no futuro ainda aqui haja gente.

Não desdenho, com isto, de quem optou por deixar o seu lar para buscar a fortuna em paragens estranhas e até mesmo estrangeiras, antes pelo contrário, louvo-lhes a coragem de abraçar a difícil jornada de começar tudo de novo. E sei que na sua saudade, tudo farão para, com os que cá estão, permitir a estas terras um lugar no e com futuro.

Mas não o podemos fazer sozinhos, nem apenas com boa vontade, é necessário que o desgoverno da sangria de serviços cesse e que nos deem as condições tão necessárias para trilhar esse caminho. É necessário que se perceba que palavras e boas intenções não criam hospitais nem centros de saúde, que sem serviços ferroviários e de mobilidade as estradas são apenas vias de saída para pessoas e produtos, que a investigação académica não é fomentada e aliciada com ar e vento, que a população não se fixa se para isso não houver condição.

Faltam pessoas no Interior, é verdade. Mas não nos falta vontade. E para que as pessoas fiquem, para que as pessoas voltem, para que o Interior se possa desenvolver, e com isso ajudar o país a crescer, o que mais falta é acção.

Outros artigos deste autor >

Nasceu em Macedo de Cavaleiros, Coração do Nordeste Transmontano, em 1983, onde orgulhosamente reside. Licenciado em Línguas, Literaturas e Culturas, publicou poemas e artigos na extinta fanzine “NU” e em blogues, antes de editar em 2015 o livro-objecto “Poesia Com Pota”. Português de Mal e acérrimo defensor da regionalização foi deputado municipal entre 2009-2013.
Este autor escreve segundo o antigo acordo ortográfico.

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Related Posts
Estação Ferroviária da Guarda
Ler Mais

Economia a pedais

Economia a pedais 2021 vai ser um ano de recuperação da Economia, um esforço que todos os sectores…
Ler Mais

Desabafos de uma cuidadora

De acordo com um ditado japonês "o que deves ao teu pai é maior do que a montanha e o que deves à tua mãe é mais profundo que o oceano".
Foz Coa
Ler Mais

De novo as gravuras rupestres

Quando ficar desconfinado hei de regressar ao Côa. Quero voltar a sentir a energia daquelas terras ancestrais. Quero…
Skip to content