Neutro é o champô.

LGBTI+
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O Governo alegou “dever de neutralidade” para não assinar uma carta à Comissão Europeia, subscrita por 13 Estados-membros, que condena uma lei húngara como “discriminatória para as pessoas LGBTI+”.

Um novo diploma da Hungria, aprovado a 15 de junho, proíbe a representação e a promoção de uma ‘identidade de género diferente do sexo à nascença, da mudança de sexo e da homossexualidade’, junto de pessoas menores de 18 anos.

Segundo a missiva subscrita por Bélgica, Holanda, Luxemburgo, França, Alemanha, Irlanda, Espanha, Dinamarca, Finlândia, Suécia, Estónia, Letónia e Lituânia, este diploma constitui “uma forma flagrante de discriminação assente na orientação sexual, na identidade e na expressão do género”. Viola ainda o direito à liberdade de expressão, sob o pretexto de proteger as crianças.

Portanto, falamos de um ataque a direitos humanos fundamentais, perante o qual o Governo Português responde com “neutralidade”.

Esta neutralidade é uma falácia. O conceito neutro existe no champô, no detergente e no sabonete, existe na química relativamente ao pH e na física relativamente à carga elétrica, não existe nos direitos humanos, onde uma posição neutra acaba simplesmente por representar permissividade e cumplicidade para quem coloca os mesmo em causa.

O Governo português torna-se, com esta posição, cúmplice da discriminação, da violência, do ódio e da opressão das pessoas LGBTI+. Uma posição que tem sido contestada, que não representa o país e que deve ser revista!

A carga simbólica desta posição, disfarçada de não posição, é ainda mais forte se nos lembrarmos que estamos em junho, celebrado mundialmente como o Mês do Orgulho, aludindo à revolta de Stonewall de 28 de junho de 1969, em Nova Iorque, nos Estados Unidos da América, considerado dos acontecimentos mais marcantes para o movimento de defesa dos direitos LGBTI+.

Mas este novo diploma húngaro não é o único caso recente de retrocesso nos direitos desta comunidade. Desde 2019, vários municípios e regiões da Polónia declararam-se livres do que chamam “ideologia LGBTIQ” e adotaram as chamadas “cartas regionais dos direitos da família”. Em 2020, também a cidade húngara de Nagykáta adotou uma resolução banindo a “disseminação e promoção de propaganda LGBTIQ”.

Estas ações não tiveram efeitos neutros na vida das pessoas. Segundo um estudo da Agência dos Direitos Fundamentais da União Europeia (FRA), tiveram como consequência, concreta e direta, o aumento de atos de violência dirigida contra pessoas LGBTI+ ou contra pessoas que sejam consideradas como sendo LGBTI+. O estudo evidencia ainda o medo generalizado da população em frequentar determinados locais, pelo risco de aí sofrerem agressões, assédio, hostilidade ou ameaças de vária ordem.

Vamos escolher a indiferença e, atrás de uma falsa neutralidade, vamos alimentar a violação de direitos humanos e o crescimento da violência contra as pessoas LGBTI+? Ou vamos recusar a neutralidade, recusar o ódio, a discriminação, a segregação, escolher  hastear bandeiras de todas as cores, pelo direito a ser e a existir, de todas as pessoas, em liberdade e com dignidade?

Carolina Gomes
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Ativista. Formada em Antropologia. Deputada na Assembleia Municipal de Viseu pelo Bloco de Esquerda.

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