Imagem & Revolução: 45 Anos de Abril – Ciclo Prec 2

Dois olhares sobre o PREC visto pelos estrangeiros.

Dá-se a revolução, a 25 de abril de 1974, o povo ocupa as ruas, aliando-se ao exército. Há que registar a revolução em curso. Há que filmar e documentar este agitado período que Portugal vive. É em cima do acontecimento que surgem estas obras cinematográficas.

“Torre Bela” (1977)

Este é um dos mais emblemáticos filmes realizados neste período, em Portugal, durante o Verão Quente de 75. No entanto, o olhar é de um estrangeiro, de um alemão, Thomas Harlan.

“No dia 23 de Abril de 1975, cinco semanas depois do golpe de 11 de Março e dois dias antes do aniversário da revolução 500 desempregados da região de Manique, no Ribatejo, juntam-se num movimento campesino e ocupam as quatro propriedades de Dom Manuel de Bragança, o Duque de Lafões. Antiga propriedade de exploração agrícola, Torre Bela não é mais do que uma imensa reserva de caça alugada aos amigos da família e lugar de encontro da polícia política secreta, a PIDE, com a CIA e os serviços sul-africanos.”

Thomas Harlan e a sua equipa filma, durante oito meses, na Torre Bela, o processo de ocupação de uma herdade pelo povo local. Deste modo dá-nos a conhecer o que foi realmente o PREC (Processo Revolucionário em Curso) e o que se perdeu e o que se ganhou.

Harlan filma longas discussões entre os trabalhadores; o palácio do duque de Lafões a ser ocupado, tal como a sua herdade; uma discussão sobre a quem pertence uma enxada; reuniões em praça pública onde todos falam ao mesmo tempo e ninguém se entende, etc. Tudo isto aconteceu mesmo. Foi real. Ou será que não foi? Será que tudo isto aconteceu na realidade? Terá Harlan interferido na ação dos acontecimentos, para contar a sua própria história? Tudo isto aconteceu, mas as imagens de Harlan interpretam à sua maneira esses acontecimentos. É legitimo. O cinema é e sempre foi uma interpretação da realidade. Poderemos falar de cinema-verdade. Mas o que é a verdade? Não há duvida que Harlen tentou intervir nos acontecimentos.

Este é um documentário antropológico bastante controverso que nos questiona se o realizador deve ou não intervir nos acontecimentos que estão a ser filmados pela câmara, como aconteceu com Thomas Harlan neste filme. “Torre Bela” é ainda hoje um objecto de estudo fascinante sobre o poder da imagem e sobre o Portugal do pós 25 de abril.

“Scenes From The Class Struggle in Portugal” (1977)

“Cenas da Luta de Classes em Portugal” é outro dos olhares estrangeiros sobre o PREC, realizado por dois norte-americanos, Robert Kramer e Philip Spinelli. O tema aqui tratado é a ‘luta de classes’ em Portugal, recorrendo através de imagens de arquivo de outros filmes, como por exemplo do filme “As Armas e o Povo”.

Tal como em “Torre Bela”, Kramer mostra-nos aqui a ocupação de terras e de fábricas, os excessos, os erros cometidos. Trabalhadores contra patrões, contra polícia. E o povo agora tem um pouco mais de liberdade.

São muitas as entrevistas aqui expostas, que pela forma como o documentário foi construído assemelha-se mais a um thriller. Narrado pelo próprio Robert Kramer, este escreveu mais tarde numa carta de 1995 o seguinte: “Fico feliz por mostrarem este filme, pois tantos anos depois, é como dar notícias de um sítio que não existe, informações sobre um tempo que realmente existiu”. É um filme que mostra bem as contradições deste conturbado período em Portugal.

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Se disséssemos que éramos um bando de miúdos, um tanto sonhadores, que queriam fundar um site para escrever sobre cinema e que, por algum desígnio divino, pudéssemos fazer da vida isto de escrever sobre a sétima arte, seria isso possível? A resposta é óbvia: dificilmente. Todavia Isso não impediu o bando de criá-lo em 2008, ano da fundação do Cinema Sétima Arte. O espírito do western tinha-se entranhado em nós…
“A atividade crítica tem três funções principais: informar, avaliar, promover”. É desta forma que pretendemos estimular o debate pelo cinema.
Acima de tudo, escreveremos sempre como cinéfilos, esses sonhadores enamorados da sétima arte.
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Portuense mas reside em Viseu desde 2015 e é apaixonado por cinema e política. É administrador do site Cinema Sétima Arte, programador de cinema no espaço Carmo 81 e fez parte da equipa que reabriu o Cinema Ícaro, em Viseu, com o Desobedoc 2018. É ativista na Plataforma Já Marchavas, que organizou a 1.ª Marcha LGBTI+ de Viseu, em 2018.

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