Cineasta ucraniano Sergei Loznitsa condena boicote ao cinema russo

O cineasta ucraniano Sergei Loznitsa condena o boicote ao cinema russo que tem vindo a ganhar cada vez mais adeptos em todo o mundo. “Quando ouço hoje esses apelos para proibir os filmes russos, penso nesses (cineastas) que são boas pessoas. Eles são vítimas como nós desta agressão”.
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Segundo avançou a Variety, o cineasta ucraniano Sergei Loznitsa enviou uma carta a condenar o boicote ao cinema russo, dizendo que “muitos amigos e colegas, cineastas russos, se posicionaram contra essa guerra insana”.

“Quando ouço hoje esses apelos para proibir os filmes russos, penso nesses (cineastas) que são boas pessoas. Eles são vítimas como nós desta agressão”, acrescentou o cineasta ucraniano que na segunda-feira tinha criticado a posição branda da Academia Europeia de Cinema (EFA) relativamente à invasão russa da Ucrânia. Loznitsa desfiliou-se assim como membro da EFA, criticando a sua linguagem em relação à invasão que está a decorrer desde o dia 24 de fevereiro, mas diz que nunca teve a intenção de provocar esse boicote aos filmes russos.

Após estas críticas de Loznitsa, premiado por filmes como “No Nevoeiro” (2012), “A Praça” (2014), “The Event” (2015) “Donbass” (2018) e “Funeral de Estado” (2019), a EFA emitiu ontem um comunicado excluindo oficialmente a Rússia dos European Film Awards 2022 (Prémios do Cinema Europeu).

“A Academia condena veementemente a guerra iniciada pela Rússia – a soberania e o território da Ucrânia devem ser respeitados. As ações de Putin são atrozes e totalmente inaceitáveis, e condenamos veementemente. O que mais nos preocupa é o destino dos ucranianos, e os nossos corações estão com a comunidade cinematográfica ucraniana. Temos plena consciência de que vários dos nossos membros estão a lutar com armas contra o agressor. A Academia, portanto, excluirá os filmes russos dos European Film Awards este ano e damos o nosso apoio a cada um dos elementos do boicote”, diz o comunicado da EFA.

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“Donbass” (2018), de Sergei Loznitsa

O boicote à cultura russa tem vindo a ganhar adeptos um pouco por todo o mundo, em particular à cinematografia russa. A Disney, a Warner Bros. e a Sony Pictures decidiram suspender a estreia na Rússia dos seus lançamentos cinematográficos, assim como a Netflix confirmou que não vai cumprir a nova lei audiovisual da Rússia, que exigia à plataforma incluir cerca de 20 canais públicos para operar no país.

A Academia de Cinema da Ucrânia pediu um boicote internacional ao cinema russo, apelando às instituições pan-europeias a excluir o país de instrumentos financeiros como o fundo Eurimages do Conselho da Europa, ao mesmo tempo em que pediu a produtores, distribuidores e festivais para rejeitarem “a cultura do estado agressor, que desencadeou uma guerra injustificada e não provocada na Europa central”.

Vários festivais de cinema estão a excluir filmes russos financiados pelo Estado, assim como o Festival de Cinema de Cannes afirmou ontem em comunicado que proibirá delegações institucionais russas de visitar a sua próxima edição (a decorrer de 17 a 27 de maio), mas que não o fará em relação aos realizadores. “A menos que a guerra de assalto termine em condições que satisfaçam o povo ucraniano, foi decidido que não receberemos delegações oficiais russas nem aceitaremos a presença de qualquer pessoa ligada ao governo russo.”

Como o mundo caiu numa grave crise e vê uma parte da Europa em estado de guerra, o Festival de Cinema de Cannes gostaria de expressar todo o seu apoio ao povo ucraniano e a todos aqueles que estão atualmente na UcrâniaPor mais modesto que seja, estamos a unir a nossa voz a todos aqueles que se opõem a esta situação inaceitável e denunciam a postura da Rússia e dos seus líderes.”, diz o certame em comunicado.

“Os nossos pensamentos vão em particular para os artistas ucranianos e profissionais da indústria cinematográfica, bem como para as suas famílias, cujas vidas estão agora em perigo. Há aqueles que nunca conhecemos, e aqueles que conhecemos e recebemos em Cannes, que vieram com obras que dizem muito sobre a história da Ucrânia e o presente. No entanto, gostaríamos de saudar a coragem de todos aqueles que na Rússia correram riscos para protestar contra o assalto e invasão da Ucrânia. Entre eles estão artistas e profissionais do cinema que nunca deixaram de lutar contra o regime contemporâneo, que não podem ser associados a essas ações insuportáveis, e aqueles que estão bombardeando a Ucrânia.”, conclui o certame.

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“Donbass” (2018), de Sergei Loznitsa

Numa entrevista recente à revista Variety, um produtor veterano de cinema russo critica o boicote à cinematografia do seu país.

“A necessidade de a Europa fazer uma declaração clara contra a guerra é compreensível e necessária. No entanto, banir todos os russos dos grandes eventos culturais não é apenas inútil – é prejudicial”, disse o produtor. “Centenas e milhares de trabalhadores culturais russos discordaram abertamente da decisão do governo de iniciar uma guerra: eles condenam as suas ações, vão a protestos, apoiam a Ucrânia, correm o risco de serem condenados por traição. Quase todos eles não votaram em Putin.”

O produtor acrescentou: “Ao banir essas pessoas de eventos internacionais, a Europa está a silenciar a voz de protesto russa, isolando pessoas que querem parar a guerra junto com pessoas que querem intensificá-la”.

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Se disséssemos que éramos um bando de miúdos, um tanto sonhadores, que queriam fundar um site para escrever sobre cinema e que, por algum desígnio divino, pudéssemos fazer da vida isto de escrever sobre a sétima arte, seria isso possível? A resposta é óbvia: dificilmente. Todavia Isso não impediu o bando de criá-lo em 2008, ano da fundação do Cinema Sétima Arte. O espírito do western tinha-se entranhado em nós…
“A atividade crítica tem três funções principais: informar, avaliar, promover”. É desta forma que pretendemos estimular o debate pelo cinema.
Acima de tudo, escreveremos sempre como cinéfilos, esses sonhadores enamorados da sétima arte.
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Portuense mas reside em Viseu desde 2015 e é apaixonado por cinema e política. É administrador do site Cinema Sétima Arte, programador de cinema no espaço Carmo 81 e fez parte da equipa que reabriu o Cinema Ícaro, em Viseu, com o Desobedoc 2018. É ativista na Plataforma Já Marchavas, que organizou a 1.ª Marcha LGBTI+ de Viseu, em 2018.

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