O futuro socialista só poderá ser feminista e não militarista e hierarquizado. O futuro socialista não será um futuro centralizado no Estado-nação e na dissuasão nuclear, mas em estruturas horizontais e rizomáticas. O socialismo só terá futuro através da socialização das práticas do cuidado que não são propriamente uma invenção do futuro, mas algo que acontece e sempre aconteceu no interior das nossas sociedades capitalistas, hierarquizadas e patriarcais, para além de racistas e homofóbicas. O cuidado contém a sua própria história de resistência que se confunde com a história da luta de classes e do combate a todo o tipo de opressões. Não será então por acaso que aquilo a que chamamos de estado social e que percebemos como uma “conquista civilizacional” é sustentado não só na ideia de cuidado, na ideia da dignidade da vida humana independentemente do estatuto social e económico de cada um e de cada uma, como em práticas feministas contrárias à mercantilização do valor e que têm no trabalho das mulheres um papel determinante. O futuro socialista já não será patriarcal e só será possível e viável através do protagonismo político das mulheres; um protagonismo que se desenvolve não a partir dos lugares tradicionais do poder fundados à imagem da sociedade patriarcal e das suas dinâmicas (legítimas ou não legítimas) de comando e de obediência, mas da sua própria quotidianidade laboral e extralaboral. Mais ainda, o futuro do socialismo não é do domínio do utópico, mas algo que já vemos a ser construído aqui e agora, apesar e contra todas as investidas do capitalismo neoliberal com a sua sede de privatizar e de transformar as áreas do cuidado no negócio do século.
Por infelizes contingências da vida uma pessoa da minha família esteve internada no hospital público. Posso dizer, por mim e por ela, que desde a sua entrada nas urgências até à alta dos serviços de pneumologia que tudo correu exemplarmente e que a doente em causa não podia ter estado em melhores mãos e cabeças. De facto devíamos agradecer ao SNS todos os dias. É a prova viva, material, de que é possível oferecer os melhores serviços de saúde à população independentemente da sua condição socioeconómica e fora desse regime de competição permanente que caracteriza o mercado. Desde as auxiliares, passando pelas enfermeiras, até ao pessoal médico, tudo concorreu para que a estadia da doente fosse a mais confortável e acolhedora dentro do que é possível e, principalmente, que o acesso ao melhor tratamento e cuidados de saúde lhe fosse prestado de acordo com os recursos à disposição. Escusado será talvez referir que a maioria desta força de trabalho é composta por mulheres.
Nasce em 1986 e habita nesse território geográfico e imaginário que é o Interior. Cresce em Viseu e faz a sua formação universitária na Covilhã, cresce tendo a Serra da Estrela como pano de fundo. As suas áreas de interesse académico são a filosofia, a política e a literatura. Actualmente está a terminar um doutoramento em filosofia.