Há uma ideia sobre o que é isso do comunismo ou do viver em comunismo que me seduz bastante. E o comunismo, nessa visão, se o preferirem nessa utopia, resume-se à “aristocratização” da classe trabalhadora após a dissolução da sociedade de classes. Simplificando: é a tal “vida boa” – conceito ético, filosófico e político que podemos remontar ao aristocrata Aristóteles – para todos. Mas não é a aristocratização ao modo da ideologia burguesa, que só concebe o bem viver por meio da acumulação contínua da propriedade e da continuação da exploração de classe. À maneira franciscana, que filósofos como o recém-falecido Toni Negri e o seu companheiro de jornada Michael Hard tão pertinentemente recuperam, para nos libertarmos do materialismo estreito e mesquinho da burguesia será preciso abdicarmos da riqueza associada à reprodução do capital – e todas as suas preocupações administrativas e securitárias – para vivermos a abundância da riqueza do mundo em todas as suas dimensões, a começar pela imanação da natureza em todo o seu esplendor. É portanto uma filosofia profundamente ecologista que compele o proletariado em direção a um outro mundo. Uma filosofia que alia a escolha voluntária pela pobreza concebida segundo a sua formulação burguesa à universalização da fruição da riqueza do mundo concebido, a la Espinosa, como Natureza (natura naturans e natura naturata). Nenhuma contradição, portanto, entre a necessidade de adotarmos um estilo de vida mais frugal – consubstanciada na redução do horário laboral, na comunização do trabalho reprodutivo (que tragicamente tem assentado na exploração das mulheres) e no consequente “decrescimento” económico geral – e simultaneamente termos mais e melhores condições para fruirmos de tudo aquilo que o mundo nos continua a oferecer. Também nenhuma contradição entre sermos coletivamente mais solidários e individualmente cada vez mais singulares, únicos na nossa forma de vivermos com os outros. É que contrariamente à estafada crítica liberal ao mote da revolução francesa de a liberdade ser incompatível com a igualdade e as duas, por seu turno, serem contrárias à fraternidade, só há condições materiais para maior liberdade quando há maior igualdade, e só pode haver maior liberdade e igualdade quando o espírito fraternal é também mais vivo e forte.
Nasce em 1986 e habita nesse território geográfico e imaginário que é o Interior. Cresce em Viseu e faz a sua formação universitária na Covilhã, cresce tendo a Serra da Estrela como pano de fundo. As suas áreas de interesse académico são a filosofia, a política e a literatura. Actualmente está a terminar um doutoramento em filosofia.